11 setembro, 2007

Há sempre torres para se tombar...



Baco, quadro de Michelangelo Caravaggio

Velhas e novas: descobertas
Há sempre torres para se tombar...


11 de setembro / 2007

Por Solange Pereira Pinto



Hoje me lembrei do atentado às “Torres Gêmeas” quando fui ao médico pegar mais uma receita de Zetron (cloridrato de bupropiona indicado para o tratamento da dependência à nicotina). Lá nos demos conta ao anotar a data no receituário: 11 de setembro de 2007.

Pela “fúria”, “sadismo” ou “vingança” (não se sabe), há seis anos quase três mil pessoas morreram nos Estados Unidos. Fiquei pensando em quantos “atentados e mortes“ sofri nos últimos anos. Sei que o cigarro, companheiro de 22 anos, muito me atacou por duas décadas. Sei, também, que a cervejinha, o vinho, o uísque, a vodka – integrantes do convívio social – muitos neurônios apagaram (a memória também).

Realmente têm coisas que não me recordo. Quantos porres, os diálogos completos, os retornos ao lar etc. Da mesma forma, é difícil falar o que me leva a derrubar essas duas torres tão bem erguidas e fincadas na minha vida: o cigarro e a bebida.

São drogas permitidas e viciam sim. Dão um prazer momentâneo, sim. Servem de pilares para muitas fases, fossas, finitudes, sim. São, ainda, componentes de um estilo de vida, sim.

Não consigo deixar de pensar em Vinicius de Moraes e Tom Jobim: boemia, música, poesia, prazer; ou em Ernest Hemingway (prêmio Nobel de literatura, bêbado contumaz); Michelangelo Merisi da Caravaggio (pintor italiano, considerado enigmático, fascinante, e perigoso); Ringo Starr (baterista dos Beatles, o homem dos anéis); Edgar Allan Poe (romancista, precursor da literatura de ficção científica e fantástica modernas); Maysa (cantora que quanto mais bebia melhor cantava); Elis Regina... Lima Barreto... dentre uma lista sem fim (não nos esquecendo dos geniais chamados “loucos”).

Diferentes pessoas, diferentes épocas, diferentes lugares, e alguns (ou vários) hábitos semelhantes. Apenas um estilo de vida ou uma incapacidade de ser diferente? Onde está a senha, a chave da saída, o novelo de Ariadne? Por que se entra no labirinto do Fauno ou no do Minotauro? E, em que momento se começa a construir torres gêmeas, trigêmeas, quíntuplas: álcool, tabaco e outras drogas? Na escuridão da noite ou na clareza dos pensamentos e emoções? Mais um Tostines, por favor.

Recentemente, uma amiga me questionou: “se bebe por que é depressivo ou se é depressivo por que se bebe?” Atônita recordei-me de Tostines, do ovo e da galinha e para aonde vamos e de onde viemos, essas coisas sem explicação.

O fato que o “estilo de vida” notívago, boêmio, pode propiciar experiências que o dia não nos permite. É na madrugada que perambulam os humanos demasiadamente humanos. As vidas “errantes”. Haveria algum glamour num comportamento assim? Quem sabe um sofrimento inigualável? A inquietude da lucidez?

Dizem que os dependentes oscilam. “Alternam mitomania com auto-estima rasteira; euforia e depressão; excesso de peso e cuidados com a saúde; recolhimento e exibição pública; fantasias e visões agudas da realidade”. Novamente, Tostines.

Entretanto, como derrubar as torres companheiras do dia-a-dia? Aquelas, belas e altas, que lhe contam tantas aventuras, experiências e lhe fazem esquecer o que precisa ser esquecido. Por que tirá-las da paisagem? Por serem torres invasivas? Quem é o terrorista, o algoz? Quem é criador, quem é criatura?

Foi num átimo. Como um infarto. Como um espirro. Como um piscar. Como um suspiro. Não vou mais beber e nem fumar. Como assim? Vou derrubar de uma vez por todas esses “alicerces”; vou jogar no chão as torres de espadas; vou destruir o Minotauro para salvar Creta.

Recordei. Eu já havia morrido tantas vezes. Cada decepção. Cada amadurecimento. Cada transição. Cada desistência. Cada conquista. Eu, também, já havia derrubado muitas torres. Vergonhas. Complexos. Ignorâncias. Temores. Tostines?

Haverá mais mortes, mais derrubadas, mais feridos, mais cicatrizes, enquanto se viver. Fúria? Vingança? Medo? Masoquismo? Libertação? Sei que sozinha não entro em certas lutas. Já entrei em duas batalhas e desisti.

Agora, armei o exército: cardiologista, especialista em anti-tabagismo, caminhadas diárias, água com gás na boemia, Zetron 300 mg, adesivos de Niquitin, pressão da filha de seis anos, apoio dos amigos, da família e do namorado, reserva no lounge do restaurante Japonês.

As novas velhas descobertas. “Mais do mesmo”, como se diz por ai. Perguntei ao médico: “vou tomar Zetron para sempre, né?”. “Não, claro que não. Pode criar dependência”. “Aham”, pensei. “E qual é o problema? Diabético não toma insulina para sempre?”. “Sim. Vicie-se em esporte, que também libera endorfina e tal e coisa serotonina”. “Aham”, gargalhei por dentro.

Deixo registrado aqui: sei que vencerei a guerra contra o cigarro. Talvez me vicie em caminhadas e corridas (tudo é possível). Contudo, não sei quando será o próximo 11 de setembro, o dia escolhido para se dar o golpe a “la Pinochet” ou para derrubar o campanário que se ergue daqui em diante.

O que mudou em mim? “Tostines é fresquinho por que vende mais ou vende mais por que é fresquinho?” Há sempre torres para se tombar... As velhas novas descobertas...

Um comentário:

Fernanda disse...

Que as torres voem aos céus, pra quando você chegar no paraíso. Beijos