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07 novembro, 2010

Videojogos, neurojogos e a ciência

Videojogos, neurojogos

Psicólogos americanos concluíram que os videogames de ação podem trazer benefícios cognitivos para os usuários e estimular a aprendizagem. Roberto Lent discute os resultados surpreendentes desse estudo e defende o uso desses jogos na educação.
Por: Roberto Lent
Publicado em 29/10/2010 | Atualizado em 29/10/2010
Videojogos, neurojogos
Ao contrário do que se poderia supor, os videjogos podem ser benéficos para as crianças e para os adultos: depende do conteúdo... (foto: Sean Dreilinger – CC 2.0 BY-NC-SA).
Pais e professores expressam sempre grande preocupação com a influência que as novas tecnologias de comunicação podem ter sobre o funcionamento do cérebro e o desempenho neuropsicológico das crianças.
Segundo os pessimistas, estamos à beira do apocalipse: assoladas pelo excesso de informação, pela atordoante exposição às novas mídias e pela inexorável superficialidade dos conteúdos transmitidos, nossas crianças e jovens tenderiam à deseducação, à agressividade e à falta de profundidade cultural.
Dispomos hoje de um acervo de possibilidades de acesso à cultura e à educação nunca antes imaginado
Não creio que seja assim. Nossos avós se preocuparam com a destruição do teatro pelo cinema, e nossos pais com o desaparecimento deste, ameaçado pela emergência fulminante da televisão.
Também imaginaram que os concertos de música ao vivo seriam substituídos pelas gravações em estúdio lançadas em discos de vinil e depois em CDs. Agora, nos preocupamos com o fim do livro impresso, prestes a ser enterrado pelos computadores e e-books...
Nada disso ocorreu. Ao contrário, as novas tecnologias se somaram às mídias mais antigas, e a humanidade dispõe hoje de um acervo de possibilidades de acesso à cultura e à educação nunca antes imaginado.
Kindle
A emergência de e-books como o Kindle, mostrado na foto, não ameaça os livros de papel: as duas tecnologias devem coexistir no futuro (foto: Phillip Torrone - CC 2.0 BY-NC-ND).

Separar o joio do trigo

Não é razoável culpar os formatos sem analisar seu conteúdo. Há livros bons e livros ruins, filmes educativos e outros que estimulam a agressividade e desagregação social. Do mesmo modo, há programas de TV de grande eficácia educacional, outros inócuos e outros ainda negativos. O formato é em princípio neutro: o conteúdo é que importa!
Não é razoável culpar os formatos sem analisar seu conteúdo
O seriado infantil Vila Sésamo foi analisado por educadores e psicólogos americanos há cerca de cinco anos, e a conclusão foi que tem uma influência positiva na alfabetização das crianças.
Por outro lado, o programa Teletubbiesprovocou o contrário: diminuição do vocabulário e das habilidades linguísticas das crianças telespectadoras. Duas iniciativas com a melhor das intenções, formatos semelhantes e resultados diametralmente opostos...
Vila Sésamo e Teletubbies
Dois programas com finalidades educativas, mas resultados opostos (imagens: reprodução).
Da mesma forma, os programas de computador idealizados para “exercitar o cérebro” de crianças e adultos aprimorando sua capacidade cognitiva podem não fazê-lo. Pior: eles podem até causar uma piora dos indicadores intelectuais dos usuários. Ao contrário, tecnologias criadas apenas para o entretenimento – como os videojogos de ação – podem causar benefícios inesperados.
É preciso, portanto, analisar caso a caso para separar o joio do trigo. E, como em todas as coisas, deve-se distinguir entre uso e sobreuso: comer é necessário e bom; comer demais pode causar dependência e obesidade.

Videojogos e aprendizagem

Partindo dessa ideia aberta e sem preconceito, um grupo de psicólogos americanos da Universidade de Rochester, liderados por Daphne Bavelier, analisou o impacto dos videojogos de ação sobre os mecanismos de aprendizagem e os possíveis determinantes cerebrais de sua ação. Os resultados foram surpreendentes.
O estudo foi feito em 23 rapazes com cerca de 20 anos de idade, divididos em dois grupos: jogadores regulares, que no ano anterior tinham utilizado videojogos de ação ao menos 5 horas por semana; e não usuários, que não tiveram qualquer prática no mesmo período.
Para definir “jogos de ação”, a equipe considerou aqueles que apresentam alta velocidade de eventos e imagens, grande exigência perceptual, cognitiva e motora, múltiplos focos de atenção (diferentes itens apresentados simultaneamente), imagens apresentadas nas bordas da tela e imprevisibilidade (surpresa) temporal e espacial.
Homem Aranha (videogame)
Cena do jogo 'Homem-Aranha: teia de sombras'. O estudo americano mediu como a aprendizagem é influenciada pelo uso dos jogos de ação, caracterizado por alta velocidade de eventos e imagens, grande exigência cognitiva e imprevisibilidade temporal e espacial, entre outros aspectos (imagem: reprodução).


Os 23 sujeitos foram submetidos a testes para identificar a direção de movimento predominante entre muitos estímulos visuais projetados simultaneamente em um monitor de computador. Eles deviam apertar um botão para indicar se o movimento predominante era para a direita ou para a esquerda. Os pesquisadores podiam variar a proporção de estímulos com movimento sincronizado, misturados a outros movendo-se em todas as direções.
Além disso, os participantes foram solicitados a identificar tons musicais puros de diferentes intensidades, misturados a um chiado constante como uma estação de rádio fora de sintonia. Nesse caso, os tons eram apresentados a um ouvido ou outro aleatoriamente, e os rapazes tinham que apertar os mesmos botões indicando o ouvido direito ou o esquerdo.
O resultado foi interessante: jogadores regulares e não usuários apresentavam igual precisão na identificação dos estímulos, tanto visuais como auditivos. Mas os primeiros eram muito mais rápidos no gatilho: apertavam o botão certo mais rapidamente que os não-usuários. Isso significa que têm maior agilidade de raciocínio e conseguem tomar decisões mais rapidamente.
Jogadores regulares tinham maior agilidade de raciocínio e conseguiam tomar decisões mais rapidamente
E atenção: o melhor desempenho dos jogadores regulares não se restringiu ao sentido da visão, modalidade ativada durante o jogo.
Mais do que isso, estendeu-se à audição, indicando uma transferência transmodal, no jargão técnico. Ou seja: usuários de videojogos de ação não treinam apenas a visão: aprendem as melhores estratégias para tomar decisões com rapidez e eficiência.
Mas será que o efeito se deve ao treinamento ou, ao contrário, os videojogadores são naturalmente selecionados por uma capacidade inata para processar mais eficientemente estímulos visuais e auditivos?
Essa pergunta foi também respondida pelos pesquisadores. O grupo de não usuários recebeu 50 horas de treinamento em videojogos e foi novamente testado depois dessa prática. Não deu outra. Desta vez o mesmo grupo de não usuários teve bom desempenho, tornando-se videojogadores como os rapazes do outro grupo.

Redes neurais e os circuitos envolvidos

Em situações reais, fora do aparato experimental, quando um macaco ou um ser humano visualiza nos lados do campo visual um estímulo em movimento, procura mover os olhos na direção do estímulo e acompanhar o seu movimento, para melhor discernir o que é. Há regiões no córtex cerebral dedicadas à identificação dos estímulos, outras de orientação do olhar, e as primeiras se ligam às segundas.
Os videojogos treinam habilidades cognitivas gerais, e não apenas restritas a uma modalidade sensorial
Esse circuito foi modelado pelo grupo de Rochester utilizando as famosas redes neurais, construções de programas de computador que simulam as operações dos neurônios conectados.
A simulação apoiou plenamente os resultados experimentais, pois indicou uma via de processamento de etapas sensoriais até a interpretação e a elaboração de uma resposta, seguindo curvas muito semelhantes às obtidas com os rapazes testados.
Nesse caso, a modelagem por computador sustentou a constatação mais surpreendente do experimento: os videojogos treinam habilidades cognitivas gerais, e não apenas restritas a uma modalidade sensorial. A pessoa aprende estratégias cognitivas, ou seja, aprende a aprender.

Neuroeducação à vista

Experimentos desse tipo trazem indicações importantes. Primeiro, as novas tecnologias de comunicação e entretenimento não são necessariamente boas ou más: é preciso estudar o seu efeito nas capacidades cognitivas dos usuários. Em segundo lugar: se as novas tecnologias podem ter efeitos positivos, por que não usá-las nos processos formais e informais de educação?
Por que não usar as novas tecnologias nos processos formais e informais de educação?
Videojogos poderiam ser criados com a intenção de educar, e não apenas entreter. Além disso, poderiam apresentar conteúdos menos tendentes à agressividade e à violência e mais voltados para os benefícios da solidariedade e da vida social integrada.
E, finalmente: o conhecimento das estratégias neurais empregadas nas tarefas cognitivas que realizamos a toda hora trará uma base mais sólida para compreender de que modo nosso cérebro realiza essas tarefas com tanta eficiência.
A malandragem definitiva dos educadores será conceber tecnologias que imitem e ajudem o cérebro no processo de aprendizagem.
Sugestões para leitura:

A.M. Owen e colaboradores (2010) Putting brain training to the test. Nature vol. 465: pp. 775-778.

D. Bavelier e colaboradores (2010) Children, wired: For better and for worse.Neuron, vol. 67: pp. 692-701.

C.S. Green e colaboradores (2010) Improved probabilistic inference as a general learning mechanism with action video games. Current Biology vol. 20: pp.1573-1579.

29 outubro, 2010

O país das mãos leves

25 DE OUTUBRO DE 2010


O país das mãos leves

Estudo inglês mostra que o Brasil só perde para a India em prejuízos causados por pequenos furtos em lojas. A explicação vai além da clássica lei de Gérson



Se for verdade que a lassidão moral da elite política apenas reflete as condutas da sociedade em geral, os brasileiros precisam se submeter a um choque de ética. Um estudo divulgado na semana passada pelo Centro de Pesquisa em Varejo da Inglaterra. concluiu que o Brasil é o segundo país que mais perde dinheiro com pequenos furtos em lojas, ao lado do Marrocos e superado apenas pela Índia. Entre julho de 2009 e junho de 2010, as principais redes varejistas brasileiras registraram 3.9 bilhões de reais em perdas com esse tipo de crime, o equivalente a 1,64% do total do faturamento. 




Por Julia Carvalho





Em um negócio em que a margem de ganho é apertada, esse número significa a diferença entre o lucro e o prejuízo. No caso dos supermercados e farmácias, por exemplo, para cada item roubado, outros cinco iguais precisam ser vendidos para compensar o dano.



A pesquisa comparou os dados sobre furtos em lojas de 42 países. Taiwan registrou o índice de perda mais baixo. 0,879. O desempenho do Brasil é vergonhoso: nossos consumidores surrupiam mais do que os de outras nações em desenvolvimento, como México, Tailândia e Argentina. A compulsão por roubar sem necessidade não explica esse comportamento. "Não há nenhum indício de que existam mais cleptomaníacos no Brasil do que no resto do mundo. Isso aponta para uma razão cultural para o fenômeno", diz a psicóloga Marisa de Abreu. de São Paulo. O senso comum diria que a lei de Gérson. a de querer levar vantagem em tudo, é intrínseca ao brasileiro. A busca pelo beneficio próprio, no entanto, não é exclusividade do povo que vive entre o Chui e o Oiapoque.



O problema é a noção, enraizada na mentalidade nacional. de que as instituiç0es devem servir aos seus propósitos pessoais. não para organizar a vida em sociedade. no caso dos órgãos públicos.ou para prestar um serviço pago a população, no caso da iniciativa privada. "Muitos clientes se sentem no direito de levar alguns produtos sem pagar porque consideram estar fazendo um favor de comprar naquela loja", diz Gustavo Messiano Velehov, diretor-geral da filial brasileira da Checki point Systems, empresa americana de equipamentos de segurança que patrocina o estudo global sobre furtos. Para não ficarem com a consciência pesada, partem do princípio de que, perto do tamanho do estoque da loja, um único item não vai fazer falta.



Os consumidores contam. muitas vezes, com a conivência dos empregados das lojas para quem não compensa arrumar confusão com cliente para defender o patrimônio do patrão. "Empresas americanas como a Limited Brands, dona da marca de lingerie Victoria"s Secret, investem no treinamento dos funcionários para resolver esse problema, diz Nuno Fouto, diretor de pesquisa do Programa de Administração de Varejo (Provar). da Fundação instituto de Administração. O treinamento tem como efeito também diminuir os crimes internos. porque os empregados passam a se sentir responsáveis pela empresa. Esse aspecto é especialmente preocupante no Brasil, onde quatro em cada der furtos dentro das lojas são feitos pelos próprios funcionários.



Nos Estados Unidos, o shoplifting, como é chamada a prática dos pequenos furtos. é combatido com modernos sistemas de vigilância e alarmes. A parafernália já revelou alguns ilustres bandidinhos, entre eles a atriz Winona Ryder e a cantora Britney Spears. Em agosto deste ano, Caroline, filha do ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani, foi presa por furtar 100 dólares em maquiagens e cosméticos. Seu pai é autor da política de tolerância zero com a criminalidade na cidade americana. Faltou. como falta no Brasil, ensinar tolerância zero em casa. 


Fonte: Revista Veja, de 27 de outubro de 2010.

21 outubro, 2010

Paulo Freire

“Se a educação não transformar a sociedade, sem ela a sociedade tampouco muda.”

{janeiro de 2010}

Paulo Freire
Paulo Freire
Ele partiu em 1997, dois anos antes de o Almanaque ganhar os céus. Porém, desde então, Paulo Freire tem sido presença constante por aqui – seja em perfis biográficos, citações ou notas sobre obras que analisaram sua vida e legado. Seu principal campo de batalha foi tema de inúmeras entrevistas. É quase unanimidade entre as dezenas de personalidades que ocuparam esta seção que os caminhos para a transformação do País passam inevitavelmente pela educação. Nesse mês que marca o início de um novo ano – um ano de mudanças de governantes por todo o País –, empunhamos mais uma vez esta bandeira, agora muito bem acompanhados. Tomamos de empréstimo seus pensamentos em vídeos, palestras, entrevistas e, sobretudo, em seus próprios escritos para provar que, apesar de ter nos deixado há 13 anos, o legado do mais importante educador brasileiro segue vivo. E extremamente necessário.


Como foi a sua infância?
Fui alfabetizado no chão do quintal de minha casa, à sombra das mangueiras, com palavras do meu mundo, não do mundo maior dos meus pais. O chão foi o meu quadro-negro; gravetos, o meu giz. Meu primeiro mundo foi o quintal de casa, com suas mangueiras, cajueiros de fronde quase ajoelhando-se no chão sombreado, jaqueiras e barrigudeiras. Árvores, cheiros, frutas, que, atraindo passarinhos vários, a eles se davam como espaço para seus cantares.(1) Tempos depois, vivendo em Jaboatão dos Guararapes, experimentei o que é a fome e compreendi a fome dos demais. Em Jaboatão, criança ainda, converti-me em homem graças à dor e ao sofrimento que não me submergiram nas sombras da desesperação. Em Jaboatão joguei bola com os meninos do povo. Nadei no rio e tive “minha primeira iluminação”: um dia contemplei uma moça despida. Ela me olhou e se pôs a rir…(2)



O senhor formou-se em Direito. Chegou a exercer a profissão?
Meu gosto não era pela advocacia. Descobri isso logo no começo. Minha primeira causa, recém-formado, foi com um jovem dentista que comprou um equipamento dentário e não pôde pagar. E eu era advogado do credor dele. Chamei o rapaz ao meu escritório: “É, doutor Paulo, eu não posso pagar. E o senhor não vai poder me acionar contra, não pode tomar meus instrumentos de trabalho. Nem tampouco minha filhinha. Mas o meus móveis o senhor pode tomar.” Deixei de ser advogado naquele dia. Eu disse pra ele: “Olhe, vá para casa, passe uns dias em paz com tua mulher, porque daqui a 15 dias eu vou devolver essa causa. Teu credor vai ter mais uma semana para arranjar outro advogado como eu, e aí vai te aperrear de novo.”(3) Ali encerrava a minha carreira como advogado. Ao contar para a minha mulher naquela mesma noite, ela riu, me beijou e disse: “Eu sabia que um dia isso ocorreria. O que você tem que fazer é educação”.(4)



A cultura é um elemento presente em sua visão sobre a educação. Como isso se refletiu na prática pedagógica?
Com as discussões sobre o conceito de cultura, o analfabeto descobriria que tanto é cultura o boneco de barro feito pelos artistas, seus irmãos do povo, como cultura também é a obra de um grande escultor, de um grande pintor, de um grande místico, ou de um pensador. Cultura é a poesia dos poetas letrados de seu país, como também a poesia de seu cancioneiro popular. Cultura é toda criação humana.5 Todos os povos têm cultura, porque trabalham, porque transformam o mundo e, ao transformá-lo, se transformam. A dança do povo é cultura. A música do povo é cultura, como cultura é também a forma como o povo cultiva a terra. Cultura é também a maneira que o povo tem de andar, de sorrir, de falar, de cantar enquanto trabalha. Cultura são os instrumentos que o povo usa para produzir. Cultura é a forma como o povo entende e expressa o seu mundo e como o povo se compreende nas suas relações com o seu mundo. Cultura é o tambor que soa pela noite adentro. Cultura é o ritmo do tambor. Cultura é a ginga dos corpos do povo ao ritmo dos tambores.(1)



Por que o analfabetismo ainda existe?
Para a concepção crítica, o analfabetismo nem é uma “chaga”, nem uma “erva daninha” a ser erradicada, nem tampouco uma enfermidade, mas uma das expressões concretas de uma realidade social injusta. Ninguém é analfabeto por eleição, mas como consequência das condições objetivas em que se encontra. Em certas circunstâncias, o analfabeto é o homem que não necessita ler; em outras, é aquele ou aquela a quem foi negado o direito de ler.(6)



O senhor considera que suas ideias mudaram a alfabetização no País?
Que podem um trabalhador camponês ou um trabalhador urbano retirar de positivo para seu que-fazer no mundo, para compreender criticamente a situação concreta de opressão em que se acham, através de um trabalho de alfabetização em que se lhes diz, adocicadamente, que a “asa é a da ave” ou “Eva viu a uva”? Mais que escrever e ler que “asa é a da ave”, os alfabetizandos necessitam perceber a necessidade de um outro aprendizado: o de “escrever” a sua vida, o de “ler” a sua realidade – o que não será possível se tomam a história nas mãos para, fazendo-a, por ela serem feitos e refeitos.(6)



Por que sua prática educacional provocou discórdias, culminando inclusive em seu exílio?
É que às classes dominantes não importava que eu não tivesse um rótulo porque elas davam um. Para elas eu era comunista, inimigo de Deus e delas. E não importava que eu não fosse. Perfila quem tem poder. Quem não tem poder é perfilado. A classe dominante tinha poder suficiente para dizer que eu era comunista. É claro que havia um mínimo de condições objetivas para que eles pudessem fazer essas acusações. A fundamentação básica para que eu fosse chamado comunista eu dava. Eu pregava uma pedagogia desveladora das injustiças; desocultadora da mentira ideológica. Que dizia que o trabalhador como educando tinha o dever de brigar pelo direito de participar da escolha dos conteúdos ensinados a ele. Eu defendia uma pedagogia democrática que partia das ansiedades, dos desejos, dos sonhos, das carências das classes populares. Essa pedagogia era mais perigosa do que o discurso sectário stalinista. Isso é óbvio. Do ponto de vista dos que deram o golpe de Estado, me pôr na cadeia foi uma atitude ideologicamente correta. Eles diziam que eu era um subversivo internacional. Eu não cheguei a tanto, mas era um cara de sonhos revolucionários.(4)



O que o senhor considera uma educação para a transformação?
Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, inviabilizando o amor. Se a educação sozinha não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda.(7) Não devemos chamar o povo à escola para receber instruções, postulados, receitas, ameaças, repreensões e punições. Mas para participar coletivamente da construção de um saber, que vai além do saber de pura experiência feito, que leve em conta as suas necessidades e o torne instrumento de luta, possibilitando-lhe transformar-se em sujeito de sua própria história.(8) A tradição brasileira, profundamente autoritária, coloca sempre o formando como objeto sob a orientação do formador, que funciona como o sujeito que sabe. É preciso deixar de ser assim. Conhecimento não se transfere, conhecimento se constrói.(9)


Paulo Freire
Paulo Freire

Qual a razão de tanta luta ao longo de sua vida?
Eu recuso qualquer previsão fatalista diante da história e dos fatos. Eu não aceito expressões como: “Lamento que haja tantos brasileiros e tantas brasileiras morrendo de fome, mas afinal a realidade é essa mesma”. Eu recuso. É falsa, é ideológica. Nenhuma realidade é assim mesmo. Toda realidade está submetida à possibilidade de nossa intervenção. A história da luta pela justiça rural e agrária neste país revela a superação da posição inicial da adaptação e adequação, inclusive como uma forma de defesa. Uma das razões da minha luta e presença no mundo é que, como educador, eu posso contribuir para uma assunção crítica da possibilidade da passividade, para que se vá além dessa passividade, do que chamo de posturas rebeldes e transformadoras do mundo.(10)



O senhor se considera um sonhador? 
Esperançosamente luto pelo sonho, pela utopia, pela esperança, na perspectiva de uma Pedagogia crítica. E esta não é uma luta vã.(11) Para mim o utópico não é o irrealizável; a utopia não é o idealismo, é a dialetização dos atos de denunciar e anunciar. O ato de denunciar a estrutura desumanizante e de anunciar a estrutura humanizante. Por esta razão a utopia é também um compromisso histórico.(2)



É do ser humano sonhar?
É inviável o ser humano continuar se ele para de pensar no amanhã. Não importa que seja um pensamento em torno do amanhã, o mais ingênuo possível, o mais imediato, o de se a gente terá café amanhã, ou se a gente vai ler ou reler Hegel ou Marx. Não importa. Nós somos seres de tal maneira constituídos, que o presente, o passado e o futuro nos enlaçam. A minha tese então é a seguinte: não pode existir um ser permanentemente preocupado com o vir a ser, portanto com o amanhã, sem sonhar. É inviável. Sonhar aí não significa sonhar a impossibilidade, mas projetar. Significa arquiteturar, significa conjecturar sobre o amanhã.(3)



Trata-se de um ato político?
Eu não posso sonhar em favor de alguma coisa se não sonho contra outra – que é aquela que obstaculiza a realização do meu sonho. Eu não posso sonhar se não tenho clareza com que e a favor de quem eu sonho. Daí o ato de sonhar ser político. Um ato ético, e um ato estético. Não é possível sonhar sem boniteza, e sem moralidade, e sem opção política. Quando você me diz: “Paulo, eu também sonho”, eu quero saber com que e a favor de quem você sonha. Qual é o sujeito beneficiário do teu sonho? É a burguesia que explora ou é a massa deserdada que sofre? E não basta que você me diga: “Eu sonho pela humanidade”. A humanidade é uma abstração. Não existe.
O meu sonho é que inventemos uma sociedade menos feia do que a de hoje. Menos injusta, que tenha mais vergonha. Esse é o meu sonho.(3)



Por que, afinal, ser professor? 
Sou professor a favor da decência contra o despudor, a favor da liberdade contra o autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade, da democracia contra a ditadura de direita ou esquerda. Sou professor a favor da luta constante contra a ordem capitalista vigente que inventou esta aberração: a miséria na fartura.(12)


O senhor foi feliz?

Fui imensamente feliz. Evidentemente que entre essas alegrias eu também tive minhas raivas, minhas decepções, minhas tristezas, mas não há como escapar disso. O que você tem que fazer é não deixar que a razão de ser da raiva e da tristeza perdurem demais. Nós vivemos muito mais momentos de alegria do que de raiva e tristeza. A raiva também é importante para poder vir a alegria. Sem estouros de raiva não construiremos a alegria.(4)


SAIBA MAIS
(1) A Importância do Ato de Ler, de Paulo Freire (Cortez, 2005).
(2) Conscientização: Teoria e prática da libertação, de Paulo Freire (Centauro, 2001).
(3) Entrevista concedida ao Museu da Pessoa em outubro de 1992.

Disponível em www.museudapessoa.org.br

(4) Entrevista concedida a Mario Sérgio Cortella e Paulo de Tarso Venceslau,

publicada na revista Teoria e Debate em janeiro de 1992.
Disponível no site da Fundação Perseu Abramo: www.fpa.org.br

(5) Educação como Prática da Liberdade, de Paulo Freire  (Paz e Terra, 2007).
(6) Ação Cultural para a Liberdade, de Paulo Freire (Paz e Terra, 1981).
(7) Citação presente na Biblioteca Digital Paulo Freire: www.paulofreire.ufpb.br
(8) A Educação na Cidade, de Paulo Freire (Cortez, 1995).
(9) Perfil biográfico publicado na seção Ilustres Brasileiros do Almanaque Brasil,

em maio de 2005. Disponível em www.almanaquebrasil.com.br

(10) Entrevista concedida à TV PUC de São Paulo em abril de 1997.

Disponível na Biblioteca Digital Paulo Freire: www.paulofreire.ufpb.br 

(11) Pedagogia da Indignação, de Paulo Freire (Unesp, 2000).
(12) Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire (Paz e Terra, 2008).

João Rocha Rodrigues e Bruno Hoffmann

Fonte Almanaque

15 outubro, 2010

Será que existe professor(a) ideal?

Será que existe professor(a) ideal?

Pouco serve idealizar educadores. Porém é possível apontar qualidades de gente de verdade, que faz um bom trabalho em condições reais

Luis Carlos de Menezes (novaescola@atleitor.com.br)
Foto: Marcos Rosa
"É preferível valorizar o trabalho de
profissionais que fazem o possível
nas circunstâncias que enfrentam,
com os recursos de que dispõem."
Foto: Marcos Rosa
Mais sobre Formação Continuada
REPORTAGENS
Visitando escolas, encontro casos de excelência no trabalho coletivo de professores, assim como de atuações individuais excepcionais. No entanto, ao dar destaque a eles, tenho sido questionado por alguns leitores sobre eventuais idealizações de minha parte. Segundo eles, os personagens de meus exemplos provavelmente não teriam o mesmo desempenho se encarassem condições adversas, como violência, indisciplina e problemas de infraestrutura ou de ordem material.

Em respeito a essa preocupação, reitero que não falo de professores notáveis, com superpoderes e capazes de qualquer proeza, em qualquer situação. É preferível valorizar o trabalho de profissionais que fazem o possível nas circunstâncias que enfrentam, com os recursos de que dispõem.

Idealizações são artificiais, como as imagens tão comuns em propagandas de carro de luxo, que mostram ao volante um jovem atlético, sorridente e ousado, mesmo quando se sabe que a maioria dos proprietários é mais velha, séria e cautelosa. A intenção é facilitar a venda, associando esse virtual comprador ao produto.

A Educação, porém, não deve estar a serviço dos valores do mercado, e sim da sociedade. Logo, as qualidades que destacam professores nada têm de publicitárias. Eu as encontro em educadores que gosto de ver no comando das salas de aula brasileiras. Vejamos quais são, em minha opinião, essas caracteristícas:

- Lucidez para não esperar alunos ideais, que já cheguem motivados, atentos e com os pré-requisitos desejados. Esses professores trabalham com os que de fato recebem e, na medida de suas possibilidades, enfrentam os desafios que se apresentam. Por isso, quase nunca se decepcionam ou se frustram.

- Respeito próprio para não aceitarem condições impróprias de trabalho, nem se limitarem a reclamar delas. Ao contrário, eles buscam transformá-las por saberem que um ambiente mais satisfatório para eles será também mais efetivo para o aprendizado de seus alunos.

- Comprometimento com a formação dos estudantes de forma que, além de ministrarem suas disciplinas, também se articulem com colegas e coordenadores em torno de ações educativas conjuntas. Sem isso, não se efetivaria o projeto pedagógico da escola.

- Consciência do próprio valor e da importância dos conhecimentos e das competências que promovem. Por isso, esses profissionais não se acomodam com o que já sabem, mas buscam aperfeiçoamento didático e cultural permanente. A partir dessa atitude, de recusa à passividade, esses docentes também rejeitam gestões pedagógicas burocráticas.

- Solidariedade para quem necessita de mais atenção, como alunos e colegas de trabalho em situação difícil.

- Coragem para intervir quando é preciso tomar decisões complicadas, como mediar conflitos, mostrando que a atitude justa não é de indiferença ou neutralidade. 


Professores que mesclam, em parte ou integralmente, essas qualidades, realmente existem e constituem uma referência de conduta importante nas escolas em que trabalham. Por isso, as instituições que os recebem são privilegiadas. Esses profissionais não são geniais ou perfeitos, mas nunca paro de aprender com eles. Também não me canso de citá-los em conversas informais, palestras e nesta coluna.

Mas não é necessário, e nem sequer possível, reunir todos eles em um único tipo ideal. Além disso, minha seleção é muito variada e inclui gente expansiva e tímida, jovem e madura, comunicativa e reservada, simples ou descolada.

Você sabe que não se fazem estátuas de educadores assim, mas eles podem ser encontrados ensinando em qualquer escola, na sua, inclusive. E, quem sabe, usando seus sapatos.
 É físico e educador da Universidade de São Paulo (USP).

Fonte: Nova Escola

10 outubro, 2010

Criança escritora

Caderno de Viagens da Pilar é lançado no Rio com contação de histórias e oficina de desenhos


Dizem que Pilar é uma personagem infantil que viaja o mundo em sua rede mágica - com viagens como a contada no seu Diário na Grécia. Não conhecemos as obras, mas ficamos encantados com a ideia, certos de que agradaria a muitos pequenos viajantes que conhecemos.
Pilar convida o leitor a escrever seu próprio Caderno de Viagens. Nele você vai fazer a viagem dos seus sonhos, criar personagens e histórias incríveis, anotar as comidas mais estranhas que provou, as palavras que aprendeu em outras línguas, os animais diferentes que viu...
Tudo com a ajuda da Pilar, essa menina curiosa que já rodou o mundo com sua rede mágica. Você vai adorar se transformar em escritor. Prepare o lápis, aperte os cintos e... boa viagem pela imaginação! Tem também: espaço para desenhar, colar fotos e guardar lembranças, cartela de adesivos supercoloridos, mapas e páginas para você contar suas aventuras.
Hoje a pequena viajante faz um pit stop no Shopping da Gávea (Av. Marquês de São Vicente, 52 - Gávea - Rio de Janeiro/RJ) no Dia das Crianças para o lançamento de seu Caderno de Viagens (Zahar, 72 pp., R$ 29) promete agitar a tarde de terça-feira (12), a partir das 16h, com sessão de fotos com a Pilar, contação de histórias narrada pela atriz Silvia Castro, oficina de desenhos com a ilustradora do livro, Joana Penna, e autógrafos de Flavia Lins e Silva na Livraria Malasartes.

Neste novo livro, as crianças podem contar sobre os lugares que visitam e sobre as aventuras de seus sonhos, imaginar personagens e histórias, anotar as comidas mais estranhas que provam, as palavras que aprendem em outras línguas, os animais diferentes que veem. Além disso, podem desenhar, colar fotos, fazer listas de favoritices e muito mais.

05 junho, 2010

Nossas escolas e a repressão à criatividade

Legenda em português (clique em subtitles)


"Se você não estiver preparado para errar, nunca terá uma idéia original"

29 maio, 2010

sites ambientais



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amazônia - amazonia.org.br
• aquecimento global - mundo quente. notícias e artigos sobre o fenômeno climático.
as plantas - informações sobre as plantas. chave da vida no planeta
biólogo.com.br - conhecer para preservar.
ibama - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos recursos naturais renováveis.
fundação sos mata atlântica - Conheça o site desta importante fundação.
instituto de pesquisa ambiental da amazônia - www.ipam.org.br
jornal do meio ambiente - meio ambiente, ecologia e informação atualizada.
(o) eco - reportagens, salada verde, colunas, entrevistas, o eco.net
recicloteca - Lixo, reciclagem, coleta seletiva, educação ambiental e informação ambiental.
socioambiental.org - legislação, manchetes, notícias
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ambio - blog da Lista Portuguesa de Ambiente (Portugal)
bioterra - reflexões sobre educação ambiental (Portugal)

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23 maio, 2010

Bate-Papo Ambiental recebe Paula Saldanha




No dia 27 de maio, em comemoração ao aniversário do IBRAM, jornalista falará de suas experiências pelo país


Sob a lente de suas câmeras, um retrato da diversidade natural, étnica e cultural do Brasil. Há 30 anos, a jornalista, escritora e ilustradora Paula Saldanha se dedica ao registro das diferentes realidades que habitam o território nacional.  Apresentadora do programa ‘Expedições’, Paula e sua equipe já produziram mais de 300 documentários média-metragem sobre as diversas regiões e populações do país.

No próximo dia 27 de maio, todas essas experiências serão tema da edição comemorativa do Bate-Papo Ambiental. Completando três anos de existência, o Instituto Brasília Ambiental (IBRAM) realiza, a partir das 14h30, no Museu Nacional, a palestra “Biodiversidade do Cerrado – Relatos de Experiências de Paula Saldanha”.

         O evento, que também dá início às comemorações da Semana do Meio Ambiente, é uma realização do IBRAM em parceria com Secretaria de Cultura, Museu Nacional e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). O Bate-Papo Ambiental é gratuito e aberto ao público. Para inscrições antecipadas, preencha a ficha de inscrição e envie para o e-mail batepapo.ibram@gmail.com. Os interessados também poderão se inscrever no dia do evento.

Pelo Brasil

Em 1994, Paula Saldanha e o biólogo Roberto Werneck formaram a primeira equipe de TV do mundo a chegar na nascente do rio Amazonas. Em 2007, eles organizaram a Expedição Científica Brasileira e Peruana à Nascente do Amazonas, que oficializou o local de origem do rio.

Paula Saldanha já foi apresentadora dos telejornais ‘Hoje’, do infantil ‘Globinho’ e do ‘Fantástico’. Durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – Rio 92 - produziu documentários e exposições bilíngues a partir de seu acervo. Com 42 livros publicados, Paula e sua equipe preparam agora uma edição do ‘Expedições’ dedicada à Estação Ecológica de Águas Emendadas (ESEC-AE).

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 SERVIÇO

Evento: Bate-Papo Ambiental do IBRAM com Paula Saldanha

Data: 27 de maio

Horário: 14h30

Local: Museu Nacional – Conjunto Cultural da República

Outras informações: Assessoria de Comunicação do IBRAM (3214-5624/5625) e assessoriaibram@gmail.com.