28 maio, 2007

Apostas

a planta
os móveis

a aposta

Tem gente que joga na loteria toda semana. Eu nunca tive esse hábito. Minhas apostas vão além desses jogos.
Uma vez, uma amiga, professora, foi demitida em pleno janeiro. Ela havia perdido o emprego, pagava aluguel, se sustentava sozinha, não tinha familiares na cidade, se viu completamente desamparada. Era verão. Então, ela foi para Porto Seguro passar férias. Todo mundo, próximo, dizia: "você é louca", "você tá maluca em viajar desempregada?", "você tem que procurar emprego e não tirar férias"...
Vinha bombardeio de todos os lados. Ela, que já estava num estado emocional abalado, só recebeu dos amigos e colegas "estímulos" do tipo: "você está ferrada e não pode se divertir".
É incrível que quando alguém está numa situação limite, os conselhos nunca são para elevar a auto-estima. Ao contrário, são para relembrar a pessoa que ela está na lama e não tem saída.
Quando perguntei a essa amiga o motivo dela viajar em tal situação, ela foi simples: "preciso de um tempo para relaxar, pensar, fortalecer, e voltar em condições para procurar algo bom, pois quem vai dar emprego a uma coitada?"
Faz sentido.
Se estamos desesperados a chance maior é de receber "pena", "compaixão". E isso, verdadeiramente, não é o que eleva.
Uma outra amiga, também, muito deprimida por falta de perspectivas profissionais e financeiras, pediu emprestado dinheiro à irmã. Com o dinheiro na mão, comprou dois vestidos, foi à massagista, ao cabeleireiro e ficou linda. Mais tarde a irmã questinou "ué, você pede dinheiro emprestado para ficar gastando com besteiras, roupa, e salão? Se soubesse que era para isso não teria emprestado". Claro, minha amiga estava resgatando sua auto-estima, do jeito dela, mas no pensamento da irmã ela deveria continuar "coitada", com cara inchada, e sem ânimo.
Reações para manter o outro na "desgraça", ditando o que ele deve ou não fazer com a própria vida é o comum. Se você está mal não pode ter qualquer prazer, porque parece absurdo.
Quando uma viaja desempregada para reabastecer as energias e a outra se produz para melhorar a auto-estima, ficam rotuladas de "inconseqüentes", "surtadas".
Fatos assim não são raros. Mas quem sabe quais são as suas próprias e maiores necessidades? Só quem passa pela situação, porque de fora só se vê parte de um problema. Eu não me espanto quando vejo algumas pessoas tomando decisões aparentemente contraditórias. Sabe-se lá o que estão de fato vivendo?
Estou agora numa situação semelhante às exemplificadas acima. No limite. E busquei por soluções arriscadas. É uma aposta. Com a trena na mão vou medindo os novos espaços. Com a calculadora não outra vou contabilizando os custos. Com lápis e papéis vou desenhando as possibilidades.
Depois de um ano bem difícil, tanto de saúde quanto de grana, dentre outros aspectos, optei por mais espaço, qualidade de vida e renovação. Aparentemente, os passos estão muito, muito mesmo, maiores que as minhas pernas, porém eu preciso apostar que se eu estiver bem ali na frente os ganhos virão em seguida. Ou não? Nesta aposta tenho 50% de chance de vencer. Vou arriscar.

8 comentários:

Anônimo disse...

Solange, achei este texto genial do Antonin Artaud, não sei se vai caber todo aqui, mas lá vai, afinal sou ou não sou colaborador free-lancer (rss) do Criando Espaços?LEIA PORQUE VALE A PENA!!!

Carta de Antonin Artaud contra as restrições na venda do ópio.

Senhor legislador da lei 1936 sobre entorpecentes, aprovada por decreto em julho de 1917, você é um castrado.
A sua lei só serve para aborrecer a farmácia mundial, sem nenhum proveito para o nível toxicômano da nação, porque:
1 - O número dos toxicômanos que se abastecem nas farmácias é ínfimo.
2 – Os verdadeiros toxicômanos não se abastecem nas farmácias.
3 – Os toxicômanos que se abastecem nas farmácias são todos doentes.
4 – O número de toxicômanos doentes é ínfimo em relação aos toxicômanos voluptuosos.
5 – As restrições farmacêuticas à droga não reprimirão jamais os toxicômanos voluptuosos e organizados.
6 – Haverá sempre traficantes.
7 – Haverá sempre toxicômanos pelo vício das formas, por paixão.
8 – Os toxicômanos doentes têm sobre a sociedade um direito imprescritível, que é o de que os deixem em paz.

É sobretudo uma questão de consciência. A lei sobre entorpecentes põe nas mãos do inspetor-usurpador da saúde pública o direito de dispor da dor dos homens - numa pretensão singular da medicina moderna de querer impor suas regras à consciência de cada um. Todos os berros oficiais da lei não têm poder de ação perante este fato de consciência: ou seja, mais ainda que da morte, eu sou dono da minha dor. Todo homem é juiz, e juiz exclusivo, da quantidade de dor física, ou também de vazio mental que possa honestamente suportar.
Lucidez ou não lucidez, tem uma lucidez que nenhuma enfermidade me arrebatará jamais, é aquela que me dita o sentimento de minha dor física. E se eu perdi minha lucidez, a medicina não tem outra coisa a fazer que dar-me substâncias que me permitam recobrar o uso desta lucidez.
Senhores ditadores da escola farmacêutica da França, os senhores são todos uns petulantes mesquinhos; tem uma coisa que deveriam considerar melhor; o ópio é essa imprescritível substância que permite devolver a vida de suas almas àqueles que tiveram a desgraça de perdê-la.
Tem um mal contra o qual o ópio é soberano e este mal se chama Angústia, em sua forma mental, médica, psicológica, lógica ou farmacêutica, como os senhores queiram.
A Angústia que faz os loucos. A Angústia que faz os suicidas. A Angústia que faz os condenados. A Angústia que a medicina não conhece. A Angústia que o seu médico não entende. A Angústia que acaba a vida. A Angústia que corta o cordão umbilical da vida.
Pela sua lei iníqua, os senhores põem em mão de pessoas nas quais eu não tenho a menor confiança, castrados em medicina, farmacêuticos de porcaria, juízes fraudulentos, doutores de parteiras, inspetores doutorais, o direito de dispor da minha Angústia, uma Angústia que é em mim tão aguda quanto as agulhas de todas as bússolas do inferno.
Tremores do corpo e da alma, não existe sismógrafo humano que permita a quem me olhe chegar a uma avaliação mais precisa de minha dor, do que aquela fulminante, feita pelo meu espírito!
Toda a fortuita ciência dos homens não é superior ao conhecimento imediato que posso ter do meu ser. Sou o único juiz do que se passa comigo.
Voltem aos seus sótãos, médicos parasitas, e você também, senhor legislador Mountonnier, que não é por amor aos homens que você delira, é por tradição de imbecilidade. A sua ignorância acerca do que é um homem é apenas comparável à sua estupidez na pretensão de limitá-lo. Desejo que a sua lei recaia sobre o seu pai, sobre sua mãe, sobre sua mulher e os seus filhos, e toda a posteridade. Enquanto isso, suporto sua lei.

Anônimo disse...

Ai, eu não aguentei, e como colaborador deste blog (rss) pus mais um texto do Artaud, meu Deus mas esse cara é genial, leia POR FAVOR!!!
Mensagem ao Papa
Antonin Artaud

Não és tu o confessionário, oh Papa! Somos nós; compreende-nos, e que os católicos nos compreendam.

Em nome da Pátria, em nome da Família, incentivas a venda das almas e a livre trituração dos corpos.

Entre nossa alma e nós mesmos, temos que percorrer muitos caminhos, que venham a interpor se teus vacilantes sacerdotes e esse acumulo de aventuradas doutrinas com que se nutrem todos os castrados do liberalismo mundial. A teu deus católico e cristão que como os outros deuses concebeu todo o mal )2 ptos(

1. Tu o meteste no bolso.

2. Nada temos que fazer com teus cânones, índex, pecados, confessionários, clerigalham.

Pensamos em outra guerra, uma guerra contra ti, Papa, cachorro.

Aqui o espirito se confessa ao espirito. Da cabeça aos pés de tua farsa romana, o ódio triunfa sobre as verdades imediatas da alma, sobre essas chamas que consomem o próprio espirito. Não ha Deus, Bíblia ou Evangelho, ano ha palavras que detenham ao espirito. Não estamos no mundo. Oh Papa confinado no mundo! Nem a terra, nem Deus falam de ti.

O mundo e o abismo da alma! Papa aleijado, Papa alheio a alma. Deixa nos nadar em nossos corpos, deixa nossas almas em nossas almas. Não necessitamos de tua espada de claridades.

ARTAUD, Antonin. Cartas aos Poderes. Porto Alegre: Editorial Villa
Martha, 1979. (Coleção Surrealistas - Vol. 1)

Anônimo disse...

Nesta noite gelada tal qual lápide, envio mais este texto lindo, maravilhoso , em forma de carta; ah se o Artaud fosse vivo e estive aqui perto, eu deixaria meu lado feminino predominar:

Carta aos Reitores das
Universidades Européias
Antonin Artaud

Senhor Reitor

Na estreita cisterna que chamais "Pensamento" os raios do espirito apodrecem como montes de palhas.

Basta de jogos de palavras, de artifícios de sintaxe, de malabarismos formais; precisamos encontrar - agora - a grande Lei do coração, a Lei que não seja uma Lei, uma prisão, senão um guia para o espirito perdido em seu próprio labirinto. Alem daquilo que a ciência jamais poderá alcançar, ali onde os raios da razão se quebram contra as nuvens, esse labirinto existe, núcleo para o qual convergem todas as forcas do ser, as ultimas nervuras do Espirito. Nesse dédalo de muralhas movediças e sempre transladadas, fora de todas as forcas conhecidas de pensamento, nosso Espirito se agita, espreitando seus mais secretos e espontâneos movimentos, esses que tem um caráter de revelação, esse ar de vindo de outras partes, de caído do céu.

Porem a raça dos profetas esta extinta. A Europa se cristaliza, se mumifica lentamente dentro das ataduras de suas fronteiras, de suas fabricas, de seus tribunais, de suas Universidades. O Espirito "gelado" range entre as laminas minerais que o oprimem. E a culpa è de vossos sistemas embolorados, de vossa lógica de dois- e - dois - são - quatro; a culpa è vossa, Reitores, apanhados na rede de silogismos. Fabricais engenheiros, magistrados, médicos a quem escapam os verdadeiros mistérios do corpo, as leis cósmicas do ser< falsos sábios, cegos para o alem, filósofos que pretendem reconstruir o Espirito. O menor ato de criação espontânea constitui um mundo mais complexo e mais revelador que qualquer sistema metafísico.

Deixa-nos, pois, Senhores< sois tão somente usurpadores. Com que direito pretendeis canalizar a inteligência e dar diplomas de Espirito?

Nada sabeis do Espirito, ignorai suas mais ocultas e essências ramificações, essas pegadas fosseis, tão próximas de nossas próprias origens, esses rastros que às vezes logramos localizar nos jazigos mais escuros de nosso cérebro.

Em nome de vossa própria lógica, vos dizemos: a vida empesta, senhores. Contemplai por um instante vossos rostos, e considerai vossos produtos. Através das peneiras de vossos diplomas, passa uma juventude cansada, perdida. Sois a praga de um mundo, Senhores, e boa sorte para esse mundo, mas que pelo menos não se acredite à testa da humanidade.

ARTAUD, Antonin. Cartas aos Poderes. Porto Alegre: Editorial Villa
Martha, 1979. (Coleção Surrealistas - Vol. 1)

Cesar Cardoso disse...

Taí uma coisa que eu deveria fazer há algum tempo mas não faço: mudar para um lugar maior. Talvez porque fazer obra e ficar planejando espaço não sejam minhas atividades prediletas...

\o/ disse...

ei Roger! mandou bem hein rsss! adorei os textos.

E Cesar, já que vc nao gosta de planejar espaços e fazer obras, contrate alguem hehehe bjsss

Fernanda disse...

Soll, amiga, dê o passo do tamanho que quiser, se suas pernas não aguentarem, empresto as minhas e a gente pula este funil.

\o/ disse...

que bom Fê, solidariedade é tudo nessa vida! bjs rsss

Anônimo disse...

Soll, vá longe porque o mundo é do tamanho que a gente o vê. Eu detesto gente que pensa pequeno. E vou te contar, estou prestes a dar saltos também. Chega de paralisias!