30 abril, 2009

A pensão alimentícia e o imposto de renda.

ESTOU INDIGNADA EM TER QUE PAGAR IMPOSTO DE RENDA SOBRE PENSÃO!
O PIOR É VER A PASSIVIDADE DE TODOS QUE RECEBEM E SE CALAM!

Uma ameaça à dignidade da pessoa humana
Kalyne Lopes de Brito
Bacharelanda em Direito pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte
Elaborado em 03.2007.


1. Introdução
O foco da presente análise incide sobre a exação do imposto de renda em face da pensão alimentícia prestada aos filhos menores.

A pensão alimentícia tem por escopo garantir àquele que não tem condições de prover o próprio sustento recursos para sobreviver dignamente. O vínculo originário da obrigação alimentícia é a solidariedade familiar, albergada no art. 229 da Constituição Federal, razão pela qual não pode representar acréscimo patrimonial.

O imposto de renda, por seu turno, incide sobre a renda e proventos de qualquer natureza ou rendimentos, sendo tal hipótese de incidência incompatível com a natureza jurídica e os fins a que se destinam os alimentos.

Importa na presente e breve análise indagar os limites da legitimidade da incidência do imposto de renda sobre os proventos de pensão alimentícia, quando conjugados com o princípio da dignidade da pessoa humana e da vedação do bis in idem, ambos princípios norteadores do Sistema Tributário Nacional, por imperativo da Carta de Outubro.

Para tanto, servimo-nos de consulta às bases legislativas pátrias, bem como procuramos alicerçar a pesquisa nos ensinamentos da literatura especializada.

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2. Alimentos: instrumento de afirmação da dignidade da pessoa humana

O comportamento social e a vida familiar evoluíram. As relações de convivência familiar e social já não são mais as rigidamente estabelecidas pelo Código Civil de 1916, em que o modelo único de família, fundado na desigualdade e sustentado pelo patriarcado, tinha na figura do homem a concentração do poder econômico e social da família.

Com o advento da Constituição de 1988 a família passou a ter especial proteção do Estado. Assim, a família contemporânea, diferentemente da família moderna do século passado, vem concebida a partir de um desenho marcado pela constitucionalização, que prestigia a proteção da família, com destaque para a dignidade da pessoa humana, a igualdade familiar e a prevalência da tutela dos interesses da criança e do adolescente.

É nesse cenário que a questão da tributação dos alimentos representa desequilíbrio, na contramão das conquistas das muitas igualdades, finalmente reconhecidas no ambiente da família brasileira.

A obrigação alimentícia funda-se sobre um interesse de natureza superior, que é a preservação da vida humana e a necessidade de dar às pessoas uma garantia no tocante aos meios de subsistência.

Nesse passo, os alimentos possuem características próprias: visam assegurar o direito à vida digna que tem assento constitucional (CF, art. 5º), sendo regulado por normas cogentes de ordem pública, devendo atender as necessidades normais de qualquer pessoa em desenvolvimento, como a habitação, a alimentação, o vestuário, o tratamento médico, a instrução, educação e o lazer.

Diante desse contexto, as prestações de caráter alimentício exercem o papel de promotores do direito à vida, podendo-se considerar ainda, no dizer de Carmem Lúcia Antunes Rocha [01], que o atributo da dignidade é inerente àquele direito (vida) onde se encontram intangíveis à própria concepção jurídico-estatal.

A obrigação alimentar cumpre um papel muito importante, qual seja, o de efetivamente servir como ambiente propício para a promoção da dignidade e a realização da personalidade dos beneficiários, aqui concentrados na figura da criança e do adolescente, os quais têm o direito de manter o mesmo padrão de vida de seu alimentante.

Desta forma, qualquer desconto da pensão alimentícia implica a redução dos valores que deveriam atender o alimentando. Descontando o imposto de renda da pensão alimentícia recebida, há inegável diminuição do quantum da pensão, na medida em que a tributação direta inevitavelmente reduzirá o valor final a ser percebido, tendo em vista que a parcela tributada não é considerada ao se deferir a prestação alimentícia. Como não há tal previsão, o que ocorre é a real diminuição do quantum que, se já é justo para atender a fins delimitados, torna-se mais limitado e, no mais das vezes, colabora para o aperto financeiro do alimentando.

Alimento não é renda e com esta não se confunde, não devendo merecer o tratamento como se rendimento fosse, bem como não pode sofrer uma interpretação extensiva que o faça incidir na expressão "proventos de qualquer natureza".

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3. Imposto de renda versus pensão alimentícia

3.1 Imposto de renda e alimentos: convivência conflituosa

Os tributos possuem, como uma de suas funções, promover a intervenção do Estado na economia (extrafiscalidade) e, especialmente a de funcionar como instrumento de redistribuição de riqueza, porém, por vezes tais funções acabam ferindo alguns princípios constitucionais como o da capacidade contributiva que é reflexo do princípio da igualdade e o da dignidade da pessoa humana.

O imposto sobre rendas e proventos de qualquer natureza encontra seu sustentáculo legal no art. 153, III, da Constituição Federal, o qual confere competência à União para instituí-lo, fixa os princípios que o cercam, delimita a sua regra matriz de incidência e expressamente coloca que o imposto deverá ser informado pelos critérios de generalidade, da universalidade e da progressividade.

Já o Código Tributário Nacional, em seu art. 43, complementa o texto da Lex Mater normatizando os aspectos gerais do citado imposto e definindo os elementos que o compõem. Na condição de norma complementar, o CTN, ao disciplinar o imposto de renda, deve guardar estrita obediência ao que se encontra previsto no texto constitucional, além de guardar harmonia com a principiologia jurídica do Sistema Tributário Nacional, também de extração constitucional.

No núcleo da exação em comento encontram-se as palavras "renda e proventos de qualquer natureza", as quais revelam o sentido de "acréscimos patrimoniais" desde que levados em consideração o conjunto de princípios que norteiam a incidência do imposto sobre a renda. O art. 43 do CTN oferece respaldo a esta afirmação, senão vejamos:

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

I – de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II – de proventos de qualquer natureza, assim entendido os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.

A incidência do imposto de renda sobre os valores auferidos como pensão alimentícia é uma forma de exploração desnecessária do menor e do adolescente, uma verdadeira ameaça ao princípio da dignidade da pessoa humana.

O recebimento de pensão alimentícia não implica aumento patrimonial para quem recebe. Em se tratando de aumento patrimonial, é interessante trazer a posição de Hugo de Brito Machado, quando ensina que:

(...) uma das bases mais universais da tributação no mundo atual é a renda que, por definição, é crescimento patrimonial resultante do capital, do trabalho, ou da combinação desses dois fatores. Verifica-se, porém, que apenas a renda derivada do trabalho, que muitas vezes não chega a ser propriamente renda porque não implica aumento patrimonial porque é inteiramente consumida no atendimento das necessidades imediatas do trabalhador, tem sido alvo da tributação no Brasil [02].

Para vislumbrar melhor tal situação podemos lembrar que no caso da obrigação alimentícia, aufere renda ou rendimento aquele que paga a pensão, e não aquele que recebe a pensão. O fisco, por sua vez, contempla o pagador da pensão com o desconto integral no imposto de renda dos valores pagos com a pensão alimentícia, privilegiando, assim, o mais forte, tornando menos oneroso o ato de pagar pensão. Por outro lado, o fisco reembolsa-se da dedução integral que concede ao pagador, cobrando o imposto de renda do alimentando, retirando daquele valor, previamente calculado, parcela destinada a promover uma vida digna ao menor de idade.

Como se percebe, o imposto de renda figura como tributo hábil em reverter aos cofres públicos parcela ou parte de rendimentos de determinado grupo de contribuintes que, sendo constatado a "aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica", nos termos dos incisos explicativos supra, é convertido em exação tributária.

Neste ponto, quando confrontado o tributo em comento com o instituto da pensão alimentícia, surge uma zona grísea de litigiosidade, entre a natureza jurídica do instituto e a assanha arrecadatória do ente público. A solução desta problemática, contudo, deve passar necessariamente pela filtragem constitucional do princípio da dignidade da pessoa humana e da vedação do confisco.

3.2. Pensão alimentícia: acréscimo patrimonial?

Há, porém, que se debruçar sobre o sentido da expressão "acréscimo patrimonial" para evitar que se cometam equívocos, incluindo aí aquisições que não possuem caráter patrimonial, como por exemplo, as pensões alimentícias, correndo-se o risco de ferir o princípio da vedação do confisco inerente ao Sistema Tributário Nacional e garantia fundamental do cidadão contribuinte.
Nesse sentido, é preciosa a lição de Mary Elbe Queiroz [03]:

Sobre o que seja acréscimo patrimonial, o vocábulo não deverá ser entendido como tudo que se somar ao patrimônio. Do contrário, o imposto incidirá sobre ingressos e não sobre a renda, pois, somente poderá ser considerado como acréscimo aquilo que efetivamente aumentou o patrimônio. O acréscimo é o resultado dos valores auferidos menos os recursos empregados na sua obtenção e na manutenção da fonte produtora. O acréscimo é o produto líquido (receitas menos custos e despesas), pois, nem toda a renda percebida ou todo o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos resulta um acréscimo patrimonial.

Em vista disso, percebe-se a impropriedade da tributação sobre o montante da pensão alimentícia, uma vez que o conceito ou o sentido dos termos que delimitam o fato gerador não se coaduna com a finalidade ou o propósito do instituto, fugindo, portanto, em uma exegese teleológica, à finalidade da pensão.

O Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999, que regulamenta a Tributação das Pessoas Físicas, por sua vez, em seu art. 5º refere-se a alimentos como "caso de rendimentos percebidos em dinheiro", in verbis:

Art. 5º No caso de rendimentos percebidos em dinheiro a título de alimentos ou pensões em cumprimento de acordo homologado judicialmente ou decisão judicial, inclusive alimentos provisionais ou provisórios, verificando-se a incapacidade civil do alimentado, a tributação far-se-á em seu nome pelo tutor, curador ou responsável por sua guarda (Decreto-Lei nº 1.301, de 1973, arts. 3º, § 1º, e 4º).

O mencionado artigo afronta o texto constitucional, uma vez que não respeita as limitações jurídicas impostas pela Constituição, em sede de matéria tributária, notadamente no art. 153, III e no CTN em seu art. 43, I e II que definem, de forma categórica, a hipótese de incidência tributária.

Ademais, viola por tergiversação princípio comezinho do direito tributário, insculpido por obra do legislador ordinário no artigo 110 do Código Tributário Nacional, consoante o qual "a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance dos institutos, conceitos e formas de direito privado (...)".

Sobre esta vedação, alerta Luciano Amaro que "(...) o legislador não pode expandir o campo de competência tributária que lhe foi atribuído, mediante o artifício de ampliar a definição, o conteúdo ou o alcance de institutos de direito privado, utilizados para definir aquele campo" [04].
Em uma interpretação extensiva deste enunciado, conjugando-o com o propósito do presente estudo, fácil se mostra perceber que a tributação do importe da pensão alimentícia esbarra neste empecilho de ordem legal.

O artigo 5º do Decreto nº 3000/1999 encontra-se eivado de incontestável ilegalidade, tendo em vista que renda e proventos de qualquer natureza são empregadas pela Constituição, segundo Hugo de Brito Machado, para limitar o âmbito de incidência do imposto de renda, não podendo o legislador ordinário defini-las livremente, sob pena de transformar a supremacia da constituição em ornamento da literatura jurídica [05].

No âmbito dos tributos não vinculados, por certo que a Lei Fundamental desenhou uma norma-padrão de incidência tributária. Para Roque Carraza, a Constituição:

ao discriminar as competências tributárias, estabeleceu – ainda que, por vezes, de modo implícito e com uma certa margem de liberdade para o legislador – a norma padrão de incidência (o arquétipo genérico, a regra matriz) de cada exação. Em síntese, o legislador, ao exercitar a competência tributária, deverá ser fiel à norma padrão de incidência do tributo, pré-traçada na Constituição. O legislador, enquanto cria o tributo, não pode fugir deste arquétipo constitucional. Era precisamente isto que Albert Hensel queria expressar quando enfatizou que toda norma tributária deve respeitar as limitações jurídicas impostas pela Constituição [06].

Em vista do exposto, as prestações alimentícias não podem ser inseridas, em decorrência de sua natureza jurídica, fundamentos e fins a que se destina, dentro da hipótese de incidência do imposto de renda, já que não representa, em essência, acréscimo de ordem patrimonial do beneficiário.
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4. Considerações finais

A legislação do imposto de renda deve ser reformada para isentar de tributação os alimentos devidos em razão de laços familiares, dedicando ao alimentando tratamento mais digno e cidadão.

Se, por um lado, o Estado procurou tutelar o direito de família contemporâneo, expressando progressos apreciáveis, de outro manteve as estruturas rígidas do século passado. Não é preciso reforma constitucional ou tributária para rever a matéria em foco, basta reformar a legislação do imposto de renda, que poderá isentar de tributação os alimentos de qualquer natureza, e assim o alimentando receberia tratamento mais digno.

Dessa forma, estar-se-ia diante dos ditames de justiça fiscal apregoados pela Carta Magna de 1988. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação e demais condições de vivência e convivência, e, imbuídos nesses ditames, assegurados pelo art. 226 da Constituição, deve ser verificado que estender à pensão alimentícia os efeitos tributários do Imposto de Renda aniquila o caráter alimentar do instituto, não se coadunando, desse modo, com os ditames constitucionais aí estatuídos.

AAssim sendo, é descabida a incidência do imposto de renda sobre alimentos, por ser tributação injusta, indevida e que ameaça a dignidade da pessoa humana, e viola frontalmente a vedação do confisco, princípios de extração constitucional.


NOTAS
01 ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. Vida digna: Direito, Ética e Ciência. In O Direito à Vida Digna. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2004, p. 43.
02 MACHADO, Hugo de Brito. Tributação capital e trabalho. Disponível em: www.hugomachado.adv.br. Acesso em 04 de março de 2007.
03 QUEIROZ, Mary Elbe. O Conceito de Renda para Fins do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Inconstitucionalidade de Lei Ordinária que Afronta o Arquétipo Constitucional de Tributo. In Construindo o Direito Tributário na Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 490.
04 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro.12ª ed, São Paulo: Saraiva, 2006, p. 220.
05 MACHADO, Hugo de Brito. A supremacia constitucional e o imposto de renda. Disponível em: www.hugomachado.adv.br. Acesso em: 23 de fev de 2007.
06 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros, 2004.

REFERÊNCIAS
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro.12ª ed, São Paulo: Saraiva, 2006
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm. Acesso em: 04 de março de 2007.
__________. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172, promulgado em 25 de outubro de 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm. Acesso em: 04 de março de 2007.
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros, 2004.
MACHADO, Hugo de Brito. A supremacia constitucional e o imposto de renda. Disponível em: www.hugomachado.adv.br. Acesso em: 23 de fev de 2007.
__________. Curso de Direito Tributário. 26ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
_____________. Tributação capital e trabalho. Disponível em: www.hugomachado.adv.br. Acesso em 04 de março de 2007.
QUEIROZ, Mary Elbe. O Conceito de Renda para Fins do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. Inconstitucionalidade de Lei Ordinária que Afronta o Arquétipo Constitucional de Tributo. In Construindo o Direito Tributário na Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2004
ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. Vida digna: Direito, Ética e Ciência. In O Direito à Vida Digna. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2004, p. 43.
Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
BRITO, Kalyne Lopes de. A pensão alimentícia e o imposto de renda. Uma ameaça à dignidade da pessoa humana. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1414, 16 maio 2007. Disponível em: . Acesso em: 29 abr. 2009.

“A vida só é digna de ser vivida quando se faz algo pela vida em vida" Adolpho Bloch

“Todas as idéias nas quais repousa hoje a sociedade foram subversivas antes de serem tutelares” (Anatole France)

29 abril, 2009

O corpo é a alma


Como uma pequena contusão pode mudar a pessoa que somos

por Denis Russo Burgierman

Cada um de nós é formado por corpo e mente, certo? Ou, se você for mais místico, mais religioso, a divisão é entre corpo e alma. De um lado, nossa essência, aquilo que nos faz únicos. Do outro, a lataria ­ ossos, carne, entranhas. De um lado, a centelha da vida, eterna e pura. Do outro, a matéria, inferior, desimportante.

Pois bem. Eu acredito que essa visão não tem pé nem cabeça, que ela é uma besteira tremenda. Não estamos divididos ao meio. Cada um de nós é um só, e aquilo que chamamos de “mente”, ou de “alma”, nada mais é que uma conseqüência direta e inevitável do corpo. São as células do nosso cérebro ­ e também as do nosso fígado, e as do nosso pâncreas, e as do intestino ­ que fazem com que sejamos quem somos. Nada mais que isso.

Poxa, leitor, me perdoe pensamentos tão pretensiosos neste espaço, que costumo dedicar às coisas pequenininhas do dia-a-dia, mas é que estes dias essas refl exões se tornaram inevitáveis para mim. Conto por quê. Semana passada fui operado. Um médico me sedou, eu apaguei, aí ele abriu uns buraquinhos no meu ombro e parafusou num osso um ligamento que estava solto. Acordei perguntando que horas seria a cirurgia, o médico gentilmente me informou que ela já tinha acabado.

Antes que você se preocupe, atencioso leitor, aviso que a operação foi um sucesso. Finalmente resolvi um problema ortopédico que me incomodava há mais de uma década. Mas agora circulo por aí com o braço esquerdo pendurado numa tipóia. Sou destro, o que quer dizer que o braço esquerdo é o mais dispensável dos meus quatro membros ­ sua imobilização não me impede de me locomover, nem de trabalhar, nem mesmo de dirigir um carro com câmbio automático. Quer dizer, meu probleminha mudou a pessoa que sou, pelo menos um pouquinho.

Por exemplo, acho que escrevo pior com a mão esquerda numa tipóia. Minha mão direita, sozinha, não consegue acompanhar o texto que eu vou bolando na cabeça. O resultado disso é este texto chato (desculpe, mas você não vai ficar bravo com um cara com uma tipóia, vai?). Outra conseqüência é que todo mundo me trata com condescendência, e o jeito que as pessoas me tratam certamente muda a pessoa que sou. Fiquei menos ativo, claro. Menos falante. Outro dia uma senhora me pediu um trocado e neguei. Na hora pensei que, em outra circunstância, daria 1 real para ela. Mas, com a tipóia, fica difícil puxar a carteira, dá preguiça. Ou seja, o braço na tipóia me tornou até menos generoso, mais egoísta. Por outro lado, fiquei mais cuidadoso, menos apressado, ansioso ­ com os dois braços eu queria tudo rápido, agora meu tempo é mais lento. Enfim, mudei. E mudei na minha “essência”.

Minha deficiência é pequenininha. E é temporária. Logo volto a ser quem eu era, só que com um ombro melhor. Mas essa história me ajudou a entender a importância do corpo ­ não só como suporte da alma, ou da mente, mas como base de tudo que somos. E me ajudou a imaginar o tamanho da dificuldade de lidar com problemas mais sérios que o meu. Daqui para a frente, vou ser mais compreensivo com quem tem dificuldades físicas. E vou cuidar bem direitinho do meu corpo.

Denis Russo Burgierman, jornalista, pegou uma bolsa de gelo e colocou no ombro logo depois de entregar este texto. gambiarra@abril.com.br

28 abril, 2009

Jogos loucos

Descobri um joguinho legal: anjo oculto! As nuvens são tão rápidas que haja atenção! Bom para distrair...

27 abril, 2009

autoconhecimento

"É preciso convir que aquilo que somos contém, queiramos ou não, um pouco da maneira como os outros nos vêem..." Sandra Jatahy Pesavento


(talvez por isso fico recolhendo feedbacks... para me dar conta de mim)

26 abril, 2009

Aborto, corpo, poder e saúde pública

por Solange Pereira Pinto

Desde o movimento feminista, o papel da mulher (e do homem) tem se reconfigurado. Por estarmos na era tecnológica e de ampla comunicação e mídias, isso se faz – aparentemente – com maior rapidez. A nova visão de mundo e as necessidades das mulheres derrubaram mitos e tem erguido diversas formas de relacionamento com o outro e com a sociedade, de tal forma que novos comportamentos e posturas podem sim influenciar aspectos da saúde pública.

O aborto, por exemplo, tem se mostrado um tema relevante para a saúde da mulher, uma vez que aquelas que decidem se submeter a essa intervenção não possuem o respaldo técnico da medicina, exceto os poucos casos previstos em lei. Mulheres sem condições financeiras e mais vulneráveis acabam por colocar a própria vida em risco ao tentarem abortar. Ainda que em nosso país o aborto seja proibido, tal fator não impede às mulheres que de fato se vejam em certas situações – limite ou não (por elas julgadas assim) – tentem recorrer a essa prática.

“Abortar” não pode mais ser tratado como um assunto apartado do contexto cultural, plural, social e globalizado em que a humanidade vive neste século XXI. Os tempos mudaram e têm mudado ainda mais. Hoje, o domínio que a mulher pretende dar ao seu corpo é muito maior do que em tempos atrás. Hoje, de modo geral, a mulher não aceita mais que seu corpo pertença ao domínio de outrem, seja esse outro a Igreja, o marido, o pai, o Estado, a Lei. Ou, ainda, ao masculino e suas formas de representação. A mulher quer dispor do seu corpo como pertencente ao seu domínio próprio (autonomia) e integrado ao seu sujeito – ser mulher, com seus valores e subjetividades. Aliadas a elas estão a camisinha feminina, a pílula do dia seguinte, o DIU, a pílula anticoncepcional. E o aborto...

O problema torna-se ainda mais grave, pois, como analisam os pesquisadores, o abortamento inseguro cria um ambiente ameaçador, de violência psicológica e de culpabilidade que leva muitas mulheres a apresentarem sintomas de depressão, ansiedade, insônia e arrependimento da escolha realizada. “O problema da gravidez não desejada deve ser enfrentado a partir de políticas públicas que reconheçam os direitos humanos reprodutivos das mulheres, que incluam os homens nessas políticas e criem nos municípios brasileiros com ações de saúde a cultura de ações de educação sexual e de atenção à anticoncepção”.

Por outro lado, interessante é notar que, contemporaneamente, podemos fazer uma série de mutilações corporais (tatuagens, piercings, silicones, próteses penianas, redução de estômago, retirada de sisos, retirada de amídalas, doação de rins, plásticas estéticas de todo tipo de órgão, amputações, depilações, escarificação e até implante de orelha no braço como vi recentemente e outras formas de bodymodification). Isso significa que a cultura do corpo tem tomado outras dimensões em nossa época. E a mulher está integrada a esse fluxo.

Segundo Domingues , o corpo “é produto e produtor do meio, nele estão inscritas as marcas bio-histórico-culturais de cada sociedade. É preciso compreender que o corpo tem uma história, é dotado de linguagem, por isso, fala e exprime seus anseios de forma bastante significativa”.

Isso pode sem dúvida gerar tensões e discussões sobre ética médica, humana, estética etc. Mas como o aborto e o papel da mulher entram nesta polêmica?

A sociedade, também, tem mudado seu conceito de reprodução biológica e social. O modelo familiar – mulher, marido, filhos – toma novas formas a partir das uniões homossexuais, das construções familiares híbridas com filhos de vários casamentos, famílias só de mulheres com avós participantes. Ou seja, a própria definição de família mudou.

Nesse sentido, a mulher vem procurando outras formas de reprodução e planejamento familiar em razão das novas tecnologias e nova visão de mundo, numa “pós-modernidade líquida, uma realidade ambígua, multiforme”, como definiu o sociólogo polonês Zygmunt Bauman e por que não dizer “descartável”.

De um lado, os métodos de reprodução assistida, inseminação artificial, proveta, barriga de aluguel, banco de esperma estão disponíveis (em maior ou menor grau) para aquelas mulheres que usam de todos os meios para atingir seu fim: engravidar.

De outro lado, resta a clandestinidade das agulhas de tricô e ingestão desmedida de Citotec. Algumas mulheres vêem a gestação como uma “invasão” de seu corpo. Outras que engravidaram “inconscientemente” quando estavam drogadas, alcoolizadas. Ou aquelas que já têm tantos filhos e sem planejamento familiar não querem mais uma gestação. São muitas as questões e conflitos que pairam nas cabeças das mulheres que optam por vários meios perigosos para se atingir um único fim: abortar.

O filósofo francês Jean-François Lyotard considerou a pós-modernidade como um tempo em que a ciência não pode ser considerada como a fonte da verdade. Se assim estamos, não há mais que se falar em condutas únicas. Por isso, o importante papel da bioética para colocar em discussão a ética da vida e as conseqüências de certas posturas para a humanidade. Discutir o que é vida, onde ela começa e quando ela termina são pautas da agenda atual.

Para tantos questionamentos, surgem infinitas teorias. “As técnicas desempenham importante papel na constituição e manutenção da sociedade do controle. Os instrumentais refinados de comunicação e informação, resultantes da terceira revolução tecnológica, enraizam-se nas subjetividades, produzem novos desejos e sensações – o pós-humano. Sobre essa base, emerge uma nova tecnologia do poder, o biopoder”, analisa Braga e Vlach

A mulher ter “direito ao aborto” é a meu ver um assunto não somente relacionado ao conceito de vida ou não do embrião/feto, mas do domínio do corpo da mulher por ela mesma. É também uma questão de poder. Há por trás do aborto muito mais subjetividades do que simplesmente “eliminar uma gravidez”.

Na sua origem, o poder biotécnico disciplinador identificado por Foucault como a forma caracteristicamente moderna do poder estava baseada em duas formas principais: “a anátomo-política do corpo humano, centrada no corpo como máquina útil e dócil, que pode ser adestrada, ampliada em suas aptidões e ‘extorquida em suas forças’ e a biopolítica das populações, centrada no ‘corpo-espécie regulável’ do ponto de vista da natalidade, mortalidade, nível de saúde e duração da vida” (Foucault, 1990, p.131).

Por fim, longe de esgotar a discussão, engravidar e abortar são questões de saúde pública que tem a mulher como protagonista e passam pela noção de poder sobre o corpo feminino.

História

No início da era cristã, advogado era alguém que falava no lugar de outra pessoa.

Hoje que nome se dá a quem fala pelo outro?

25 abril, 2009

Enfim, as pazes com a cama

Medicina & Bem-estar

Especialistas indicam uma nova receita para o tratamento da insônia, problema que atinge 20 milhões de pessoas no Brasil

por Greice Rodrigues e Mônica Tarantino

O funcionário público Rogério Gomes passou mais da metade dos seus 37 anos com muita dificuldade para dormir. Ele até contou as noites em que ficou boa parte do tempo em claro: cerca de três mil. Ele assistia à televisão, ficava no computador, comia, andava pela casa ou rolava na cama à espera do sono. No ano passado, Gomes foi ao Instituto do Sono, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), na capital paulista.

Era mais uma tentativa de tentar resolver o problema. Lá, a primeira lição que aprendeu foi identificar a causa da insônia. Nas consultas seguintes, descobriu que o que fazia à noite só servia para mantê-lo mais desperto. Até o banho que tomava na hora de ir para a cama. "Não tinha consciência de que isso tudo interferia no problema", conta. "Fiz um processo de reeducação e treinamento para abolir os hábitos prejudiciais." Hoje, ele dorme até seis horas por noite. Finalmente fez as pazes com a cama.

O segredo que ajudou Gomes a recuperar o sono foi a terapia cognitivo-comportamental (TCC), um recurso usado pela Psicologia para auxiliar os indivíduos a mudar sua maneira de se relacionar com situações indesejadas. Seu objetivo é ajudar a pessoa a identificar o que a está levando a viver determinada circunstância e auxiliá-la a alterar esses gatilhos.

No caso da insônia - mal que atinge cerca de 20 milhões de brasileiros -, o que se quer é que o indivíduo entenda a relação estabelecida com o sono, descubra o que está fazendo de errado e corrija esse caminho. A terapia faz isso a partir do trabalho sobre dois pilares: a percepção que se tem do problema, ou seja, em nível cognitivo, e as atitudes relacionadas ao que se pretende transformar - em termos de comportamento. Daí o nome de cognitivo-comportamental.

Há três meses, a TCC, como a terapia é chamada pelos especialistas, passou a ser indicada como primeira opção de tratamento para a insônia, antes mesmo dos remédios. A mudança na receita foi designada pelo novo Consenso Brasileiro de Insônia, concluído no final do ano passado pela Associação Brasileira do Sono. "Hoje o tratamento é muito baseado em medicamentos", explica o neurologista Luciano Ribeiro Pinto, do Laboratório de Fisiobiologia do Instituto do Sono e presidente da entidade. "Queremos mudar a conduta do médico e o comportamento do paciente", esclarece. A nova diretriz será publicada em revistas médicas brasileiras até o final do semestre.

O modelo segue a abordagem já usada nos Estados Unidos e na Europa. Nesses locais, a TCC tem se mostrado um recurso imprescindível. Aqui no Brasil, os primeiros resultados obtidos no Instituto do Sono são animadores. "Até 80% dos pacientes que fizeram a terapia deixaram de tomar remédios", afirma a terapeuta Maria Christina Ribeiro, especialista em distúrbios do sono e pesquisadora do instituto.

A mudança no jeito de tratar a insônia se deve à constatação de que o distúrbio tem suas raízes mais em questões psicológicas e comportamentais do que em disfunções orgânicas. Segundo os especialistas, os pacientes não têm esse entendimento e manifestam a tendência de enxergar a dificuldade para dormir como um problema isolado. Não percebem que, na maioria das vezes, ela é só um sintoma cujas causas podem ser complicações financeiras, crises familiares ou profissionais, por exemplo. "Com a TCC, ensinamos o indivíduo a dissociar os problemas", explica Maria Christina. "Ele desvia o foco da insônia e passa a administrar as duas coisas separadamente: o problema e o sono."

É preciso identificar as atitudes que impedem o adormecer ou nos levam a acordar de madrugada

À primeira vista, para quem está à procura do alívio do sono, pode ser desanimador pensar que terá de encarar um tratamento psicológico para resolver um problema que compromete tanto a vida - uma noite maldormida deixa qualquer um nervoso e desconcentrado. Uma pílula não resolveria o problema - pelo menos esse - mais rápido? Sim, mas cobrando um alto preço por isso. Segundo o neurologista Nonato Rodrigues, da Universidade de Brasília, quase a totalidade das drogas contra a insônia causa dependência a curto prazo. "Além disso, provocam prejuízos à memória e à atenção", afirma Rodrigues.

A TCC não é uma daquelas terapias sem fim, sem foco, sem resultados relativamente rápidos. O tratamento consiste geralmente em seis sessões - uma por semana. Na primeira, o paciente passa por uma avaliação para identificação, pelo especialista, das causas comportamentais ou psicológicas do problema. Depois, recebe informações sobre o sono e a insônia. Nesse momento, ele próprio começa a identificar a origem de sua dificuldade para dormir. A partir dessa etapa, é convidado a escrever um diário sobre o seu sono, relacionando os hábitos associados à hora de dormir.

Esse registro ajuda a detectar mitos e conceitos errados sobre o sono. Um dos mais comuns é esperar por ele na cama, mesmo quando ele não vem. Por meio de técnicas específicas, os terapeutas corrigem essas concepções, no plano mental, e orientam para a tomada de atitudes práticas, no plano do comportamento. Em relação a ficar rolando na cama, por exemplo, fazem uma comparação com o ato de comer. "Ninguém fica na mesa esperando a fome chegar", exemplifica Maria Christina. "Portanto, o melhor é ir para a cama quando tiver sono." Outro equívoco é realizar uma atividade, como meditação ou tomar um banho morno, e esperar que ela vá fazê-lo dormir melhor.

Tomar um banho morno antes de dormir esperando que isso ajude pode trazer ansiedade e piorar a situação

Os estudos mostraram que quando o paciente tem essa expectativa naturalmente fica ansioso para vê-la realizada. O problema é que ansiedade não combina com bom sono e o que se tem é o contrário do esperado. Outra técnica usada na TCC é a chamada intenção paradoxal: as pessoas são orientadas a fazer força para não dormir. O resultado é que a maioria pega no sono.

Para aumentar o acesso à terapia, foi criada uma versão para a internet. Em geral, o atendimento começa com um cadastramento. A condição básica é ter acesso diário ao computador, e-mail e telefone celular. No Japão, por exemplo, a maioria dos participantes dos testes que avaliam a ferramenta preferiu participar do programa usando celulares. Depois de ganhar uma senha, o interessado em se tratar online responde a perguntas sobre os hábitos de sono (a que horas vai para a cama, quantas horas dorme, se acorda durante a noite) e estilo de vida (se fuma, se faz exercícios).

Horário para adolescentes

O sono dos adolescentes tem sido alvo de estudo. É conhecida a dificuldade que eles têm para dormir cedo e pular da cama nas primeiras horas da manhã. Geralmente, dormem tarde e acordam lá pelo meio da manhã. Quando são obrigados a ir para a escola cedo, é um drama. Muitos não acompanham as aulas, de tanto sono.

Ainda não se sabe exatamente o que ocorre nessa fase da vida que leva a essa mudança. Há alguns indicativos. O primeiro seria a ocorrência de um atraso no ritmo do relógio biológico, causado pelas mudanças hormonais típicas da idade. Sabe-se que a melatonina, o hormônio que induz ao sono, começa a ser produzida um pouco mais tarde do que nos adultos. Isso atrasa o início do adormecimento e posterga o despertar.


Existe também um forte componente comportamental. Eles estão habituados a assistir à tevê até mais tarde, ficam noite adentro no computador. Retardam o sono porque demoram a ir para a cama e também porque ficam mais estimulados mentalmente.

A queda no rendimento escolar derivada das poucas horas de sono começou a preocupar pais e professores e está promovendo mudanças no horário escolar. "A solução mais sensata é atrasar os horários de atividades pela manhã", afirma Luiz Menna-Barreto, da Universidade de São Paulo (USP).

Em São Paulo, a Escola de Aplicação da USP e a Escola Estadual Francisco Brasiliense Fusco fizeram alterações. "Os adolescentes que estudavam de manhã passavam boa parte das aulas com sono. Os menores que estudavam à tarde dormiam na classe", conta Rosângela Moura, diretora da escola pública. Os horários foram invertidos. As faltas caíram e as notas melhoraram. Há iniciativas individuais também. Caio Dini, 14 anos, do Colégio Albert Sabin (SP), trocou de horário para render na escola. "Ele sentia sono pela manhã. Depois que foi transferido, virou outro aluno", diz Deise Dini, mãe do estudante.

Além disso, ele precisa dar informações diárias sobre seu estado de humor e sua disposição. A partir daí, o programa informa o beabá da insônia, como os fatores de risco, para só então introduzir as sugestões de mudanças no cotidiano. Pioneiro na investigação do potencial da internet contra o transtorno, o americano Lee Ritterband, da Universidade da Virgínia, acredita que essa é a melhor forma de reduzir o impacto mundial das noites em claro. "Vimos que esse tipo de intervenção pode melhorar o sono, o estado de humor e as funções cognitivas, como concentração e aprendizagem, prejudicadas pelo pouco sono", afirma o médico, baseado em uma pesquisa recente financiada pelo Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos.

Além da TCC, outra novidade tem empolgado os especialistas: o treinamento com imagens mentais, que associa técnicas de respiração e relaxamento com a visualização. O objetivo é levar o paciente a relaxar antes de dormir e criar imagens mentais para eliminar o fator estressante que pode estar por trás da briga contra o sono. Por exemplo, se é um cachorro que late sem parar, pode-se imaginar que o animal está num barco que vai levá-lo para muito longe. Se o que incomoda é o ranger da porta, pode-se colocar o barulho em uma caixinha e jogá-la no lixo. "O insone é uma pessoa que rumina preocupação e ansiedade.

Sem perceber, alguns também selecionam e monitoram estímulos que atrapalham o sono. É necessário trocar essas atitudes mentais por outras mais tranquilas", explica a bióloga Yara Molen, de São Paulo. Ela estuda o desempenho do método desde 2006, como tema de uma pesquisa de doutorado conduzida na Unifesp.

Até agora, 80 pessoas foram submetidas ao processo. Os resultados são bons. "A maioria aumentou seu tempo de sono entre 38 minutos a uma hora e meia", conta Yara. "Outros mudaram a percepção que tinham da qualidade do próprio sono." O engenheiro de sistemas Giovanni Celestre, 48 anos, por exemplo, submeteu-se a dez sessões para colocar abaixo as barreiras que interrompiam o seu sono e o faziam trabalhar mais para compensar a falta de concentração. "Minha insônia deixou de ser crônica e eu sei que se uma noite for ruim, na outra vou dormir bem", afirma.

A recomendação é que os remédios apresentem baixo risco de dependência e que sejam tirados aos poucos

A ascensão das duas modalidades de tratamento é o sinal evidente de que o moderno controle da insônia baseia-se principalmente em opções mais delicadas. Meditação e acupuntura, por exemplo, encontram-se entre elas. "Elas atuam na redução da ansiedade e no controle do stress, dois fatores que levam ao problema", afirma o médico e acupunturista Hong Jin Pai, do Hospital das Clínicas de São Paulo (HC-SP).

Porém, há situações na quais só as terapias não farmacológicas não bastam. "Não é raro a insônia estar associada a alterações e transtornos mentais, como a depressão", diz o neurologista Flávio Aloe, coordenador do Centro Interdepartamental de Estudos do Sono do HC-SP. Nestes casos, o remédio ainda é indispensável. Contudo, a necessidade de usar medicamentos é algo que nem todos aceitam de imediato.

A massagista e ex-publicitária Regina Chagas Paganoni, 42 anos, por exemplo, ficou surpresa ao saber que estava entrando em depressão porque não dormia bem havia pelo menos dez anos e teria de tomar antidepressivo. "Demorei a me acostumar com a ideia", lembra. Medicada, voltou a dormir e hoje trabalha com disposição.

Segundo o novo modelo de tratamento em vigor agora no Brasil, nos casos nos quais há real necessidade de remédio, o ideal é escolher entre as versões mais modernas de algumas medicações - elas apresentam menos risco de dependência. Algumas, entretanto, ainda não estão disponíveis no País. Depois, a recomendação é que o medicamento seja retirado aos poucos, com o apoio de terapias como a TCC. É nesta fase que se encontra a cabeleireira Fernanda Aparecida dos Santos, 27 anos, de São Paulo. Ela chegou a tomar três remédios por dia, e, ainda assim, não dormia. Hoje, quase um ano depois de ter começado a terapia, não usa mais medicamentos fortes e consegue, finalmente, fechar os olhos e se entregar ao sono. "A noite agora não me assusta mais", diz.

24 abril, 2009

Guias e receitas



Inovar para degustar é a meta dos apaixonados por gastronomia.





Para quem curte a arte do paladar tem um blog que dá dicas exóticas sensacionais: Gastronomix!





Confira também o guia Brasília de restaurantes e saia da mesmice caíndo de boca nas nuvens...





Dadinhos de coalho com abacaxi /Rodrigo Caetano

23 abril, 2009

o Eu na vitrine

19/4/2009

Facebook, MySpace, Orkut e Twitter.
''Só é o que se vê''.
Entrevista especial com Paula Sibilia


Redes sociais como Facebook, Twitter e MySpace são, na opinião da professora do Departamento de Estudos Culturais e Mídia da Universidade Federal Fluminense (UFF) Paula Sibilia, “compatíveis com as habilidades que o mundo contemporâneo solicita de todos nós com crescente insistência”. Segundo ela, essas ferramentas servem para dois propósitos fundamentais. “Em primeiro lugar, elas ajudam a construir o próprio ‘eu’, ou seja, servem para que cada usuário se auto-construa na visibilidade das telas. Além disso, são instrumentos úteis para que cada um possa se relacionar com os outros, usando os mesmos recursos audiovisuais e interativos”, explica.

Em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, Paula Sibilia reflete sobre as mudanças de comportamento da sociedade contemporânea e afirma que “mudaram as premissas a partir das quais edificamos o eu”. Na atual sociedade do espetáculo, continua, “se quisermos ‘ser alguém’, temos que exibir permanentemente aquilo que supostamente somos”. E dispara: “Esses são os valores que têm se desenvolvido intensamente nos últimos tempos, uma época na qual, por diversos motivos, se enfraqueceram as nossas crenças em tudo aquilo que não se vê, em tudo aquilo que permanece oculto.”

Paula Sibilia é graduada em Ciências da Comunicação, pela Universidade de Buenos Aires (UBA), mestre na mesma área, pela Universidade Federal Fluminense (UFF), e doutora em Saúde Coletiva, pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UFRJ). Atualmente, é professora no Departamento de Estudos Culturais e Mídia da Universidade Federal Fluminense (UFF). Entre suas obras, citamos O homem pós-orgânico: corpo, subjetividade e tecnologias digitais (Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002) e O show do eu (Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008). Em 2008, ela participou do Simpósio Internacional Uma sociedade pós-humana? possibilidades e limites das nanotecnologias, realizado pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O que redes sociais como Facebook, Orkut, Twitter e Myspace revelam sobre a sociedade contemporânea?

Paula Sibilia - Estas novas ferramentas, que apareceram nos últimos anos e de repente se tornaram tão populares, servem para dois propósitos fundamentais. Em primeiro lugar, elas ajudam a construir o próprio “eu”, ou seja, servem para que cada usuário se autoconstrua na visibilidade das telas. Além disso, são instrumentos úteis para que cada um possa se relacionar com os outros, usando os mesmos recursos audiovisuais e interativos.

Por isso, tanto as redes sociais como Orkut, Facebook, Twitter ou MySpace como os blogs, fotologs, YouTube e outros canais desse tipo que hoje proliferam na internet são perfeitamente compatíveis com as habilidades que o mundo contemporâneo solicita de todos nós com crescente insistência. E uma dessas capacidades que tanto se estimula que desenvolvamos é, precisamente, a de “espetacularizar” a nossa personalidade. O que significa isso? Tornarmos-nos visíveis, fazer do próprio “eu” um show.

Este fenômeno responde a uma série de transformações que têm ocorrido nas últimas décadas, que envolvem um conjunto extremamente complexo de fatores econômicos, políticos e socioculturais, e que converteram o mundo em um cenário onde todos devemos nos mostrar. Se quisermos “ser alguém”, precisamos exibir permanentemente aquilo que supostamente somos. Nos últimos anos, portanto, têm cristalizado uma série de transformações profundas nas crenças e valores em que nossos modos de vida se baseiam, e a “espetacularização do eu” faz parte dessa trama.

IHU On-Line – Que novos modelos de relações se configuram através das redes sociais? A senhora acredita que as relações ganham um novo sentido?

Paula Sibilia - Uma das manifestações dessa mutação que tem ocorrido na sociedade contemporânea é a derrubada das fronteiras que costumavam separar o âmbito privado e o espaço público, e que constituíam um ingrediente fundamental do modo de vida moderno. Então, junto com essas mudanças que se consumaram nos últimos anos, também se reconfigurou a maneira com que nos construímos como sujeitos.

Mudaram as premissas a partir das quais edificamos o eu, e isso aconteceu porque também se transformaram as nossas ambições e os nossos horizontes. Portanto, não se modificaram apenas as formas de nos relacionarmos conosco, com o próprio “eu”, mas também as relações com os outros. E ferramentas como o Facebook ou o Orkut caíram como luvas nesse novo universo: são extremamente úteis para consumar essas novas metas.

Porque na atual “sociedade do espetáculo” só é o que se vê. Portanto, se algo (ou alguém) não se expõe nas telas globais, se não está à vista de todos — sob os flashes dos paparazzis ou, pelo menos, sob a lente de uma modesta webcam caseira —, então nada garante que realmente exista. Esses são os valores que têm se desenvolvido intensamente nos últimos tempos, uma época na qual, por diversos motivos, se enfraqueceram as nossas crenças em tudo aquilo que não se vê, em tudo aquilo que permanece oculto. “A beleza interior” seria um exemplo. Enquanto isso, de forma paralela e complementar, exacerbaram-se as nossas crenças no valor das imagens, na importância da visibilidade e da celebridade como fins em si mesmos, como metas auto-justificáveis, às quais supõe-se que todos deveríamos aspirar.

IHU On-Line – A partir dessas redes sociais, como a senhora descreve o nosso atual modelo de vida?

Paula Sibilia - Há uma necessidade de se mostrar constantemente, que se exacerba por toda parte, embora não tenhamos nada muito importante para mostrar ou para dizer. Os canais interativos da Web 2.0 permitem fazer isso a vontade, facilmente e com baixos custos, de um modo ainda mais eficaz do que os meios de comunicação tradicionais. Porque essas novas ferramentas “democratizam” o acesso à fama e a visibilidade.

Mas o Orkut e o Facebook não surgiram do nada. Ao contrário, as redes sociais apareceram num terreno que já estava muito bem sedimentado para que essas práticas pudessem florescer. Nos últimos anos, temos aprendido a estar conectados o tempo todo. Utilizando as mais diversas ferramentas tecnológicas (celulares, e-mail, GPS etc.), aprendemos a estar sempre disponíveis e potencialmente em contato. Acredito que tudo isso esteja dando conta de um forte desejo de estar à vista dos outros, de sermos observados, mesmo que seja apenas para confirmar que estamos vivos. Para constatarmos que somos “alguém”, que existimos. Sem dúvida, entre várias outras coisas, há muita solidão e vazio por trás de tudo isto.

IHU On-Line – O conceito de intimidade conhecido até então é alterado a partir de programas como Facebook, Twitter, Orkut?

Paula Sibilia - Neste momento, quando tantas imagens e relatos supostamente “íntimos” estão publicamente disponíveis, é evidente que a intimidade tem deixado de ser o que era. Nos velhos tempos modernos, aqueles que brilharam ao longo do século XIX e durante boa parte do XX, cada um devia resguardar sua própria privacidade de qualquer intromissão alheia. Isso não se conseguia somente graças às grossas paredes e às portas fechadas do lar, mas também mediante todos os rigores e pudores da antiga moral burguesa.

Agora, porém, a intimidade tem se convertido em um cenário no qual todos devemos montar o espetáculo daquilo que somos. E esse show do eu precisa ser visível, porque se esses pequenos espetáculos intimistas se mantivessem dentro dos limites da velha privacidade — aquela que era oculta e secreta por definição — ninguém poderia vê-los e, então, correriam o risco de não existirem.

É por isso que hoje se torna tão imperiosa essa necessidade de fazer público algo que, não muito tempo atrás e por definição, supunha-se que devia permanecer protegido no silêncio do privado. Porque mudaram os modos de se construir o “eu” e mudaram também os alicerces sobre os quais se sustenta esse complexo edifício.

Por isso, se as práticas que eram habituais naqueles tempos (como o diário íntimo e a correspondência epistolar) procuravam mergulhar no mais obscuro de si mesmo para ter acesso às próprias verdades, nestes costumes novos a meta é outra e bem diferente. No Orkut ou no Facebook, é evidente que o que se persegue é a visibilidade e, em certo sentido, também a celebridade. Ambas como fines autojustificados e como metas finais, não como um meio para conseguir alguma outra coisa e nem como uma consequência de algo maior.

IHU On-Line – Que futuro a senhora vislumbra a partir dessas redes sociais na internet? A sociedade tende a mudar ainda mais seus hábitos e comportamentos?

Paula Sibilia - Sobre o futuro, feliz ou infelizmente, é pouco o que posso dizer. Mas acredito que já seja possível fazer algumas avaliações sobre as implicações destas novidades.

Por um lado, estamos perdendo a possibilidade de nos refugiarmos em toda aquela bagagem da própria interioridade, que oferecia uma espécie de âncora ou um porto seguro para cada sujeito, que acolchoava seu “eu” contra as inclemências do mundo exterior e contra o inferno representado pelos outros.

Por outro lado, também é claro que ganhamos algumas coisas: uma libertação daquela prisão “interior”, ao se esfacelar essa condenação a ser “você mesmo”, aquela obrigação de permanecer fiel à interioridade oculta, densa e muitas vezes terrível que amordaçava os sujeitos modernos.

Outro problema que surge com estas novidades, no entanto, é que os tentáculos do mercado se desenvolveram de um modo que teria sido impensável algumas décadas atrás, e que hoje chegam a tocar todos os âmbitos. Agora, nos inícios do século XXI, tanto as personalidades como os corpos podem se converter em mercadorias que se compram, se alugam, se vendem e depois se jogam no lixo.

Numa sociedade tão espetacularizada como a nossa, a imagem que projeta o “eu” é o capital mais valioso que cada sujeito possui. Mas é preciso ter a habilidade necessária para administrar esse tesouro, como se fosse uma marca capaz de se destacar no competitivo mercado atual das aparências. Hoje, o espírito empresarial contamina todas as instituições e se impregna em todos os âmbitos, inclusive nos mais “íntimos” e recônditos, e o mercado oferece soluções para qualquer necessidade ou desejo. Além disso, sempre será possível (e inclusive desejável) mudar de “perfil”, atualizando as informações pessoais ou alterando suas definições para melhorar a cotação do que se é. Seja no mesmo Orkut ou Facebook, ou então migrando para um novo sistema apresentado como bem melhor do que o anterior, mais atual e dinâmico, daqueles cujo surgimento e cujo sucesso potencial não cessam de ser anunciados.

Para ler mais:

22 abril, 2009

o outro sujeito

”...outrem assegura as margens e transições no mundo. Ele é a doçura das contigüidades e das semelhanças. [...] Povoa o mundo de um rumor benevolente. Faz com que as coisas se inclinem umas em direção às outras e de uma para outra encontrem complementos naturais. Quando nos queixamos da maldade de outrem, esquecemos esta outra maldade mais temível ainda, aquela que teriam as coisas se não houvesse outrem.”

Gilles Deleuze

21 abril, 2009

Blogueiros viram 'saco de pancada' e reclamam de valentões da internet

Falsa sensação de anonimato gera xingamentos e até ameaças.
Se comentários passarem dos limites, blogueiros podem entrar na Justiça.


Juliana Carpanez
Do G1, em São Paulo


O dono do terceiro blog mais lido do mundo cansou. Depois de três anos escrevendo sobre novas empresas e serviços de tecnologia, uma ameaça de morte e uma cuspida na cara, Michael Arrington, co-fundador do TechCrunch, decidiu dar um tempo do site.

“Escrevemos sobre tecnologia e empreendedorismo. São coisas importantes, mas não tão importantes para nos fazerem temer pela nossa segurança e a de nossas famílias”, afirmou o blogueiro em nome de todos os contribuintes da página. Apesar de seu afastamento, o TechCrunch continuará sendo atualizado.


Michael Arrington contou no Twitter que havia tomado uma cuspida. No blog, ele escreveu sobre as agressões e ameaças. (Foto: Reprodução )
O fato de alguém desistir da blogosfera depois de chegar ao topo do Technorati, um site com a lista dos blogs mais acessados, indica que a pressão para quem está lá em cima não é pouca. E, como mostra o desabafo de Arrington, ela vem principalmente dos leitores: pessoas que muitas vezes não economizam na agressividade e apelam até para ameaças quando discordam do blogueiro -- esteja ele envolvido com temas polêmicos ou com amenidades.


Arrington afirmou ter se tornado alvo de empresas iniciantes que não recebem a atenção desejada, além de jornalistas e blogueiros concorrentes que acusam o TechCrunch “das coisas mais ridículas”. “Responder a essas acusações não vale nosso tempo: sempre achei que nosso trabalho e integridade iriam dar a resposta para tudo isso. Mas conforme crescemos e conquistamos mais sucesso, os ataques também cresceram”, contou.


No início de fevereiro, o autor de novelas Aguinaldo Silva fez um desabafo nesse mesmo tom em seu blog. “Dou aqui o meu melhor. Procuro não apenas agradar a quem me lê, mas dar informações, provocar debates, fazer pensar (...). E o meu modo de pensar, limpo e cristalino, está exposto aqui. Em troca dessa exposição, dessa sinceridade toda, o que recebo? Chutes na bunda. Agressões as mais deslavadas, e o que é pior: de pessoas que nem sequer existem! Pois em geral, todos os que entram aqui com propósitos deletérios tratam antes de resguardar com o maior cuidado suas identidades: são todas falsas.”

No post, o coautor de "Roque Santeiro", "Vale Tudo" e autor de "Duas Caras" afirma ter questionado se valia a pena manter a página, recebendo resposta negativa de seus amigos. Depois, ele concluiu: “vou desistir do blog? Pra deixar esse bando de zé ruelas feliz da vida? Mas nem morto!”



Ciberbullying

Erick Itakura, pesquisador do Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática da Pontifícia Universidade Católica (PUC), classifica a agressão na blogosfera como um tipo de ciberbullying -- o termo define um comportamento agressivo e repetitivo adotado contra alguém no universo virtual, mesmo sem motivação aparente.



“O blogueiro exerce o direito dele de liberdade de expressão. Mas muitos leitores se incomodam e acabam querendo impor outras verdades”, afirmou o especialista, lembrando que a sensação de anonimato existente na internet facilita esse tipo de ação.

Segundo Itakura, as reações extremas na blogosfera acontecem quando alguém tem dificuldades em lidar com os sentimentos provocados pelo conteúdo postado - seja ele raiva, frustração, inveja ou admiração. “A agressão mostra que, de alguma forma, as informações tocaram a pessoa e ela não soube lidar com isso. Às vezes é mais fácil o leitor enxergar um defeito no blogueiro, que se expõe, do que nele mesmo.”


Ameaças


Rosana Hermann, 51, passou por uma situação parecida com a relatada pelo co-fundador do TechCrunch. Hoje dona do Querido Leitor, ela já chegou a fechar um blog e sair do país com a família, depois de receber uma ameaça no estilo “sei onde seus filhos estudam”.


Em outra ocasião, pagou um advogado até conseguir quebrar na Justiça o sigilo de um leitor definido por ela como “o clássico covarde na vida real, que se torna o bam-bam-bam atrevido sob o manto do anonimato”.

No segundo caso, após quebra de sigilo, ela acabou conversando com esse leitor pelo telefone -- ao identificar seu perfil, Rosana acabou desistindo do processo. O homem tinha 42 anos, era um administrador de empresas desempregado, morava com os pais, era separado e justificou os meses de perseguição à blogueira dizendo que queria ser como ela.

Depois de quase dez anos na blogosfera, Rosana diz que sua reação à agressão dos leitores depende de seu estado de espírito. “Quando vejo que a pessoa realmente só quer atenção, ignoro. Quando acho que existe alguma chance de trazê-la para a ‘luz’, comento no blog. Mas aí os outros leitores reclamam, dizendo que só dou atenção para quem me ofende”, contou em entrevista ao G1.


Se o comentário feito pelo internauta for mais “pesado, patológico ou perigoso”, ela o repassa a seu advogado, para que ele tome medidas legais.

O advogado Marcel Leonardi, especialista em direito digital, não vê problemas quando as críticas feitas em um blog são dirigidas ao conteúdo postado, e não à pessoa - nestes casos, eles diz que o debate é válido e está dentro dos limites da liberdade de manifestação de pensamento. No entanto, quando o leitor passa a ofender o blogueiro pessoalmente e vice-versa, pode-se cogitar os crimes de calúnia, injúria ou difamação.


Se isso acontecer e o blogueiro quiser entrar com uma ação judicial, Leonardi aconselha a não apagar o comentário. A informação preservada permite descobrir, com auxílio da Justiça, o endereço IP de quem publicou o texto. Assim, é possível identificar o responsável pela ofensa e tomar as medidas cabíveis.



Opinião

O jornalista Vitor Birner, 40, diz ser diariamente agredido nos comentários postados no Blog do Birner, uma página para fãs de futebol. “Há várias formar de agressão. O leitor mente a meu respeito, diz que falei o que não falei, fiz o que não fiz, penso o que não penso. E eu aprovo os comentários na gigantesca maiorias das vezes, por achar que as pessoas devem mostrar quem são”, contou ao G1. Segundo ele, também há muitas colocações interessantes, de pessoas inteligentes em sua página. “O blog é um local de informação e opinião. Ter de tudo faz parte.”

No mesmo endereço virtual desde 2007, Birner geralmente releva as agressões. No entanto, confessa que vez ou outra tem “seus dias” e responde às provocações deixadas na página. “Quando dizem que manipulo as informações, recomendo que não voltem ao meu blog. Se não acreditam no que escrevo, não devem perder seu tempo precioso de vida comigo.”

A estratégia de Renê Fraga, 25 anos, é tentar entender os leitores do Google Discovery -- mesmo aqueles mais agressivos. Ele diz sempre tentar oferecer um espaço para que o usuário da página expresse suas idéias.


“O trabalho do blogueiro é público e estamos envolvidos com diferentes tipos de pessoas. Por isso, é sempre importante manter uma conversação entre todos os envolvidos na blogosfera, respeitando suas opiniões”, defende.


Sem comentários

Já o Te Dou Um Dado?, com informações sobre o universo das celebridades, adota a direção oposta. A página criada por três blogueiros em abril de 2007 era aberta para comentários, mas com o tempo eles foram fechados. “Como a voz do povo definitivamente não é a voz de Deus, acabamos com essa história”, contou Ana Paula Barbi, a Polly, uma das criadoras do site.

A falta de espaço para comentários não impede, no entanto, que pessoas dispostas a agredir mandem e-mails para os blogueiros, muitas vezes com endereços falsos. “Quando ficaram sabendo que sofri uma parada respiratória, choveram mensagens. Mas o número de e-mails desejando melhoras foi infinitamente maior do que os xingando e celebrando minha quase-morte.”

Polly garante nunca se ofender com esse tipo de agressão, alegando que as pessoas não sabem xingar direito. “Elas não são criativas. É sempre aquela história de ‘você é gorda’. Poxa, jura? Valeu o toque, nunca tinha reparado”, ironizou a blogueira. “Grande parte desse recalque vem de uma vontade enorme de ser igual a nós. A pessoa queria muito ter um blog legal, mas não consegue e então apela para a agressão”, continuou, ecoando a explicação do psicólogo Erick Itakura.

19 abril, 2009

Porque eu vivo à noite

"O sucesso é construído à noite! Durante o dia você faz o que todos fazem."
Por Roberto Shinyashiki

Não conheço ninguém que conseguiu realizar seu sonho, sem sacrificar feriados e domingos pelo menos uma centena de vezes. Da mesma forma, se você quiser construir uma relação amiga com seus filhos, terá que se dedicar a isso, superar o cansaço, arrumar tempo para ficar com eles, deixar de lado o orgulho e o comodismo. Se quiser um casamento gratificante, terá que investir tempo, energia e sentimentos nesse objetivo. O sucesso é construído à noite! Durante o dia você faz o que todos fazem.

Mas, para obter resultado diferente da maioria, você tem que ser especial. Se fizer igual a todo mundo, obterás os mesmos resultados. Não compare à maioria, pois infelizmente ela não é modelo de sucesso. Se você quiser atingir uma meta especial, terá que estudar no horário em que os outros estão tomando chope com batatas fritas. Terá de planejar, enquanto os outros permanecem à frente da televisão. Terá de trabalhar enquanto os outros tomam sol à beira da piscina.

A realização de um sonho depende de dedicação. Há muita gente que espera que o sonho se realize por mágica. Mas toda mágica é ilusão. A ilusão não tira ninguém de onde está. Ilusão é combustível de perdedores. "Quem quer fazer alguma coisa, encontra um meio. Quem não quer fazer nada, encontra uma desculpa."

18 abril, 2009


A mudança é a lei da vida!

17 abril, 2009

Diálogos impossíveis

Cena de novela. Caminho das índias. César e Aida discutem ao telefone porque ele depositou pensão alimentícia a menos. Camila fala com Leinha:


A filha, cansada de ver a mãe discutir com o pai por causa da pensão alimentícia, chorosa pergunta à irmã:

- Por que eles não conversam civilizadamente como gente grande?

A irmã responde:

- Porque o papai não é gente grande.


_________________

( Solange pensando alto)

Já vi essa cena na vida real, apenas nunca pensei nesta sábia resposta. Eu na minha mania de achar que sempre o diálogo deve ser soberano, esqueço-me que, antes dele, há que se ter duas pessoas capazes e dispostas. O que raramente acontece simultaneamente. Uma pena. Dai este mundo cheio de monólogos alternados.

16 abril, 2009

o simples que cria o exótico

"Viver (ou criar) é o resultado de um diálogo contínuo entre o arbítrio e o inesperado, a ordem e a desordem, a necessidade e o acaso".

Ferreira Gullar




Lápis e cor e grafite sobre papel. Fantástico!


Veja o blog de Márcia de Moraes

15 abril, 2009

"A Poesia Surge do Espanto"


De repente, quando se ergue da cadeira, o poeta percebe que o fêmur de uma perna resvala no osso da bacia. Aquilo o intriga. “É desse tipo de surpresa que nasce um poema”, diz Ferreira Gullar


Por Armando Antenore (Revista Bravo!)





Certa manhã, enquanto fazia recortes para novas colagens, notou que umas tiras miúdas de papel salpicavam o piso da sala. Mal se abaixou com a intenção de recolhê-las, viu que formavam um desenho abstrato. A figura inusitada e bela surgira de modo espontâneo, à revelia de qualquer pretensão estética. O escritor, hipnotizado, apanhou os pedacinhos de papel e os fixou em uma cartolina amarronzada exatamente da maneira como caíram no chão. Batizou o trabalho de Por Acaso, Puro Acaso. Quem percorre o apartamento carioca logo avista a composição pendurada numa nesga de parede e um tanto oprimida pelas dezenas de outros quadros e gravuras que decoram o imóvel — a maioria de artistas tão míticos quanto Iberê Camargo, Rubem Valentim, Oscar Niemeyer e Marcelo Grassmann. "Todos bons amigos", comenta o dono da casa, com um híbrido de displicência e orgulho.

O episódio dos papéis revela muito sobre o jeito de o poeta enxergar a vida e o ato criativo. Para o autor do célebre Poema Sujo, viver (ou criar) é o resultado de um diálogo contínuo entre o arbítrio e o inesperado, a ordem e a desordem, a necessidade e o acaso. O assunto veio à tona numa tarde abafada de fevereiro, ao longo da conversa de três horas que Gullar manteve com BRAVO!. O apartamento de Copacabana, silencioso àquela altura do dia, serviu de cenário.

Viúvo, o maranhense namora a poetisa gaúcha Cláudia Ahimsa. Ele a conheceu durante a Feira do Livro de Frankfurt, na Alemanha, em 1994. Pouco tempo antes, amargara a morte da mulher, Thereza Aragão, e de um dos três filhos, o caçula Marcos. Inspirado pela atual companheira, escreveu os versos "Olho a árvore e já/ não pergunto 'para quê?'/ A estranheza do mundo/ se dissipa em você".

BRAVO!: O senso comum costuma apregoar que poetas nascem poetas. Poesia é destino?

Ferreira Gullar: Prefiro dizer que é vocação. O poeta traz do berço um modo próprio de lidar com a palavra. Não se trata, porém, de um presente dos deuses, de uma concessão divina, como se pregava em outras épocas. Trata-se de um fenômeno genético, biológico, sei lá. Há quem nasça com talento para pintar, jogar futebol ou roubar. E há quem nasça com talento para fazer poemas. Sem a vocação, o sujeito não vai longe. Pode virar um excelente leitor ou crítico de poesia, mas nunca se transformará num poeta respeitável. Quando um jovem me mostra originais, percebo de cara se é ou não do ramo. Leio dois ou três poemas e concluo de imediato. Por outro lado, caso o sujeito tenha a vocação e não trabalhe duro, dificilmente produzirá um verso que preste. Se não estudar, se não batalhar pelo domínio da linguagem, acabará desperdiçando o talento. "Nasci poeta, vou ser poeta." Não, não funciona assim. Converter a vocação em expressão demanda um esforço imenso. Tudo vai depender do equilíbrio entre o acaso e a necessidade. A vocação é acaso. A expressão é necessidade. Compreende a diferença? No fundo, a vida não passa de uma constante tensão entre acaso e necessidade.

Nada escapa desse binômio?

Nada. O que faz o homem sobre a Terra? Luta para neutralizar o acaso. Eis a principal necessidade humana: driblar o imprevisível, a bala perdida. Concebemos Deus justamente porque buscamos nos proteger da bala perdida. Deus é a providência que elimina o acaso. É o antiacaso.

Você não crê que Ele exista?

Gostaria de acreditar, mas não acredito. Uma pena... Poucas crenças podem ser mais reconfortantes do que a fé em Deus. Ele enche de sentido as nossas vidas sem sentido. "Eu não sou cachorro, não!", cantava o Waldick Soriano, lembra? Uma frase sugestiva, já que os homens realmente não se veem como cachorros. Os homens anseiam uma condição sublime. Não à toa, inventaram Deus: para que Deus os criasse. Se você pensar direito, todas as coisas abstratas ou concretas que a humanidade constrói têm a intenção de dar significado à vida — e, não raro, um significado especial. Nós, que frequentemente praticamos atos injustos, inventamos a justiça. Por quê? Porque desejamos ser melhores do que somos e tornar menos insolúvel o mistério de viver. A arte surge pelo mesmo motivo.

Conclui-se, então, que o poema também almeja dar significado à vida.

O poema nasce do espanto, e o espanto decorre do incompreensível. Vou contar uma história: um dia, estava vendo televisão e o telefone tocou. Mal me ergui para atendê-lo, o fêmur de uma das minhas pernas bateu no osso da bacia. Algo do tipo já acontecera antes? Com certeza. Entretanto, naquela ocasião, o atrito dos ossos me espantou. Uma ocorrência explicável de súbito ganhou contornos inexplicáveis. Quer dizer que sou osso?, refleti, surpreso. Eu sou osso? Osso pergunta? A parte que em mim pergunta é igualmente osso? Na tentativa de elucidar os questionamentos despertados pelo espanto, eclode um poema. Entende agora por que demoro 10, 12 anos para lançar um novo livro de poesia? Porque preciso do espanto. Não determino o instante de escrever: "Hoje vou sentar e redigir um poema". A poesia está além de minha vontade. Por isso, quando me indagam se sou Ferreira Gullar, respondo: "Às vezes".

A falta de controle sobre o ato de escrever o angustia?

Não, em absoluto. A experiência de criar um poema é maravilhosa. Mas, como não depende inteiramente de mim, sei que corro o risco de nunca mais vivenciá-la. Se parar de fazer poesia, vou lamentar — só que não a ponto de disparar um tiro na cabeça. Nenhum poema, de nenhum poeta, me parece imprescindível. Dante Alighieri poderia não ter escrito A Divina Comédia. Ou poderia tê-la escrito de outro jeito. Novamente: tudo se subordina à lei do acaso e da necessidade.

Um poema deve sempre emocionar?

Sim, deve emocionar primeiro o poeta e depois o leitor.

O pernambucano João Cabral de Melo Neto, com quem você conviveu, pensava diferente, não? Ele preconizava uma poesia menos emotiva.

João Cabral gostava de mentir! (risos) Pegue o poema O Ovo de Galinha e veja se aquilo não comove o leitor. Você acha que o João também não se comoveu ao escrevê-lo? Lógico que se comoveu! Na verdade, João recusava a ideia de o poeta transformar a poesia em confessionário, em objeto do sentimentalismo. Daí proclamar que o poema tinha de ser uma construção intelectual. A razão lhe serviu de bússola. No entanto, paradoxalmente, inúmeros de seus versos não resultaram tão frios. À medida que o tempo passa, o João se revela cada vez mais complexo, uma soma de contradições — o que, no fim das contas, só aumenta a grandeza dele.

Você concorda quando os críticos apontam o Poema Sujo, de 1975, como sua obra máxima?

Difícil responder. Não me debrucei profundamente sobre o assunto... O Poema Sujo é, de fato, o que reúne o maior número de interrogações e descobertas — em parte, pela extensão (os versos se espalham por quase 60 páginas); em parte, pela febre criativa que me assaltou enquanto o redigia. Entre maio e outubro de 1975, fiquei imerso no que classifico de "estado poético". Nada me tirava daquele clima. Eu comentava, brincando, que me tornara uma espécie de rei Midas. Tudo em que botava a mão virava ouro, tudo virava poesia. Foi uma fase excepcional. Para mim, porém, trabalhos mais recentes podem ter importância idêntica à do Poema Sujo, por exprimirem reflexões novas, algo que não me ocorrera dizer antes.

Uma parcela da crítica sustenta que você é o maior poeta brasileiro vivo. É mesmo?

Imagine! E como se mede o tamanho de um poeta?, já perguntava Carlos Drummond de Andrade. Que régua consegue dimensionar um negócio desses? Claro que, quando escuto uma avaliação do gênero, me envaideço. Mas não me iludo. Cada poeta, vivo ou morto, é inigualável. O João Cabral, o próprio Drummond, o Vinicius de Moraes, o Mário Quintana nos transmitiram um legado riquíssimo. São inventores de um universo muito pessoal e insubstituível. Sem mencionar o Murilo Mendes, autor de pérolas tão lindas quanto "A mulher do fim do mundo/ Chama a luz com um assobio".

Poeticamente, você jamais permaneceu num único lugar e sempre procurou a renovação. Em contrapartida, como crítico, acabou recebendo a pecha de conservador, por rejeitar diversas manifestações da arte contemporânea. O rótulo o incomoda?

Não, não me incomoda. Nesta altura do campeonato, quando o vale-tudo se apoderou das artes plásticas, a qualificação de "conservador" perdeu sentido. Conservador por quê? Por diferenciar expressão e arte? No meu entender, toda arte é expressão, mas nem toda expressão é arte. Se me machuco e grito de dor, estou me expressando; não estou produzindo arte. Da mesma maneira, se alguém começa a bater numa lata, emite sons; não cria música. O filósofo francês Jacques Maritain, católico, afirmava que a arte é "o Céu da razão operativa". Ou melhor: é o ápice do trabalho humano. Arte, portanto, pressupõe o "saber fazer". Saber pintar, saber dançar, saber esculpir, saber fotografar, saber tocar, saber compor. Tal critério prevaleceu durante milhares de anos, desde as cavernas até o advento das vanguardas, no final do século 19, período em que se questionou o "saber fazer". Pois bem: sob a minha ótica, a preocupação vanguardista é um fenômeno que se esgotou. Por milhares de anos, a arte seguiu adiante sem ligar para o conceito de vanguarda. Ninguém me convencerá de que, em pleno século 21, crucificar-se na traseira de um Fusca, deixar-se filmar cortando a vagina ou masturbar-se numa galeria equivale a um gesto artístico. Segundo o norte-americano John Canaday, historiador da arte, os críticos de hoje temem repetir o erro cometido pelos críticos do século 19, que não compreenderam os impressionistas. Em consequência, assinam embaixo de qualquer bobagem que levante a bandeira do "novo". Percebe a armadilha? Caso três ou quatro artistas resolvam espremer uma bisnaga de tinta no nariz de um crítico, ouvirão dele que praticaram um ato inovador. Definitivamente, não penso desse modo.

Nos tempos de militância comunista, você usou a poesia com fins políticos. O engajamento dos poetas ainda se justifica?

Não, de jeito nenhum. Os poetas, agora, irão se engajar em quê? No socialismo ridículo do Hugo Chávez? Foi um engano imaginar que versos contribuiriam para a revolução social. Admito que um poema consiga iluminar o leitor, consiga lhe abrir a cabeça. Mas daí a mudar a sociedade... Muito complicado! Abandonei todos os mitos daquela época. Não creio mais em luta de classes. Já aprendi que o capitalismo é como a natureza: invencível.

E a crise econômica que o mundo enfrenta atualmente? Não põe o capitalismo em xeque?

Sem dúvida atravessamos um momento delicadíssimo. Mesmo assim, estou convicto de que o capitalismo resistirá. Trata-se apenas de mais uma crise num sistema que vive de crises. Repito: o capitalismo vai imperar porque segue a lógica da natureza. É brutal, é feroz, é amoral. Não demonstra piedade por nada nem por ninguém. Em compensação, nos oferece uma série de benefícios. O capitalismo, à semelhança da natureza, se desenvolve espontaneamente. Não precisa que meia dúzia de burocratas dite o rumo das coisas, como acontecia nos regimes socialistas. Em qualquer canto, há um cara inventando uma empresinha. De repente, no meio deles, aparece um Bill Gates. São multidões em busca de dinheiro! Impossível deter uma engrenagem tão eficiente. Podemos, no máximo, brigar para que as desigualdades geradas pelo capitalismo diminuam. Aliás, convém que briguemos. Não devemos abdicar de um mundo mais justo, ainda que capitalista.


Como você avalia o governo Lula?

Avalio mal. O Lula é um grande pelego. Sabe aquele indivíduo que se infiltra nos sindicatos para amortecer os conflitos entre trabalhadores e patrões? O Lula age exatamente assim. Por um lado, agrada os banqueiros e os empresários. Por outro, corrompe o povão com programas assistencialistas. Posa de líder popular, e a massa o aplaude. Viva o pai dos pobres! Resultado: todo mundo confia no Lula, o rico e o miserável. Em decorrência, as tensões sociais se diluem. Que maravilha, não? Um país de carneirinhos...

Em setembro de 2010, você completa 80 anos. Sente-se realizado?

Olha, a vida é uma cesta em que, quanto mais se põe, mais se deseja colocar. Estamos sempre partindo do zero. Hoje pinto um quadro ou termino de ler um livro. Fico satisfeito. Mas, amanhã, me pergunto: e agora?

14 abril, 2009

Caminho em frente pra sentir saudade

Janta (Marcelo Camelo e Mallu Magalhães)


informe o(s) compositor(es)
Eu quis te conhecer mas tenho que aceitar
Caberá ao nosso amor o eterno ou o não dá
Pode ser cruel a eternidade
Eu ando em frente por sentir vontade

Eu quis te convencer mas chega de insistir
Caberá ao nosso amor o que há de vir
Pode ser a eternidade má
Caminho em frente pra sentir saudade

Paper clips and crayons in my bed
Everybody thinks that i'm sad
I'll take a ride in melodies and bees and birds
Will hear my words
Will be both us and you and them together

Cause i can forget about myself, trying to be everybody else
I feel allright that we can go away
And please my day
I let you stay with me if you surrender

Eu quis te conhecer mas tenho que aceitar
(I can forget about myself trying to be everybody else)
Caberá ao nosso amor o eterno ou o não dá
(I feel all right that we can go away)
Pode ser a eternidade má
(And please my Day)
Eu ando sempre pra sentir vontade.
(I'll let you stay with me if you surrender)

13 abril, 2009

Páscoa



"Se tiver que ir, vá.
Se tiver que parar, pare.
Mas não vacile".

(In: Aqui e agora, 100 pensamentos zen-budistas)

















Arte: Ana Luppso

10 abril, 2009

pesquisa sobre blog... começa o interesse acadêmico pelo fenÔmeno

Oi pessoal, estou participando de uma pesquisa e aproveito para compartilhar com vocês o meu pensamento...

_________________________



Esta é uma pesquisa qualitativa para uma matéria acadêmica. Ela tem como objetivo mostrar a influência de um blog na vida profissional do comunicador.
Por isso, gostaria que você respondesse a algumas questões.

Entrevistada: Solange Pereira Pinto

• Data de início do blog 03.04.2006

• Média de visitação mensal/diária média mensal 2.500 - média diária entre 80 a 120

• Tempo investido na manutenção do blog diariamente/semanalmente - Depende da época. Em geral, gasto pelo menos 10 horas semanais pesquisando na internet ou produzindo textos para atualizar o blog.



Perguntas

Quais são as tendências da sua profissão?
Creio que a tendência da profissão, tanto professora quanto jornalista, é utilizar cada vez mais as tecnologias e os blogs como ordenadores de conteúdo

• Por que criar um blog?
Depende. Para uso pessoal, entendo que o blog é um espaço de expressão. Nele podemos nos valorizar como sujeitos produtores de conhecimento, idéias e textos. Há nisso uma "liberdade" de ser "autoral". Podemos, assim, escrever o que vemos e pensamos sobre o mundo. Além disso, podemos comentar notícias, replicar outros pensamentos. O blog é democrático, uma vez que disponibiliza espaço gratuito para quem se interessar. Antes, os espaços eram caros ou destinados a pessoas escolhidas, colunistas famosos etc. Agora todos podem mostrar o que querem. Isso é muito bom e enriquece os debates.

Quais os meios de comunicação que você utiliza para se manter atualizado?
Praticamente a Internet. Leio muitos livros e artigos científicos também.

• Você acompanha blogs sobre quais assuntos? Quantos?
Nossa, acompanho vários blogs. Principalmente aqueles ligados às artes, jornalismo e educação. Além disso, acompanho blogs pessoais de pessoas que julgo interessantes. Não sei avaliar quantos blogs eu acompanho...

• Em que sentido ler outros blogs te influencia pessoalmente?
Influencia na abertura do pensamento. A partir de outras idéias eu amplio a minha visão de mundo. E, também, aprendo novas tecnologias e recursos para utilizar nos meus blogs.

Quais as semelhanças [relação] entre seu blog e seu trabalho?
Hum... Da mesma forma que preciso estudar, ler, inovar na minha profissão, preciso fazer o mesmo com o blog para que ele se torne interessante.

Como seu blog prejudica suas atividades profissionais?
Não vejo muitos prejuízos. Talvez o maior dele seja o tempo. Quando gasto muito tempo para manter meus blogs, deixo de dedicar tempo a alguma outra ativiidade. Embora eu aproveite o conteúdo dos blogs para dar aulas, por exemplo. No fim, tudo se mistura. A vida hoje é muito mais complexa. Sem investimento pessoal não dá para ser bom profissional. Precisamos derrubar certos mitos de que o tempo para o trabalho é utilizado somente no trabalho. Somos seres indissolutos,o que dedicamos à vida pessoal reflete na profissional e vice-versa. Uma pessoa que tem blog está quando não diretamente, está indiretamente se aperfeiçoando profissionalmente. Ou seja, está ordenando infomações, está se atualizando, está fazendo resumos, está exercendo o pensamento crítico, está se expondo às críticas e elogios dos outros, está sendo pro-ativo, está praticando a escrita, está conhecendo novas tecnologias, está melhorando a performance de pesquisador etc. Tudo isso é um "treinamento" não pago pela empresa que amplia as habilidades do indivíduo. Como isso pode ser prejuízo? Apesar de termos muitas empresas/pessoas ainda com pensamento retrogrado... Mas isso é outra coisa.

Quais as oportunidades que seu blog já te proporcionou profissionalmente?
Além do desenvolvimento das habilidades que mencionei, tenho me tornado referência nos blogs pedagógicos. O blog pessoal já me deu novos clientes. No dia a dia profissional, os meus blogs me dão um diferencial, pois entendo de uma tecnologia que nem todo mundo domina e algumas empresas já estão partindo para os blogs corporativos.




06 abril, 2009

*O mundo conforme Casciari*

Li uma vez que a Argentina não é nem melhor, nem pior que a Espanha,só que mais jovem. Gostei dessa teoria e aí inventei um truque para descobrir a idade dos países baseando-me no 'sistema cão'. Desde meninos nos explicam que para saber se um cão é jovem ou velho, deveríamos multiplicar a sua idade biológica por 7.. No caso de países temos que dividir a sua idade histórica por 14 para conhecer a sua correspondência humana. Confuso? Neste artigo exponho alguns exemplares reveladores.

A Argentina nasceu em 1816, assim sendo, já tem 190 anos. Se dividimos estes anos por 14, a Argentina tem 'humanamente' cerca de 13 anos e meio, ou seja, está na pré-adolescência. É rebelde, se masturba, não tem memória, responde sem pensar e está cheia de acne. Quase todos os países da América Latina têm a mesma idade, e como acontece nesses casos, eles formam gangues. A gangue do Mercosul é formada por quatro adolescentes que tem um conjunto de rock. Ensaiam em uma garagem, fazem muito barulho, e jamais gravaram um disco. A Venezuela, que já tem peitinhos, está querendo unir-se a eles para fazer o coro. Em realidade, como a maioria das mocinhas da sua idade, quer é sexo, neste caso com Brasil que tem 14 anos e um membro grande.

O México também é adolescente, mas com ascendente indígena. Por isso, ri pouco e não fuma nem um inofensivo baseado, como o resto dos seus amiguinhos. Mastiga coca, e se junta com os Estados Unidos, um retardado mental de 17 anos, que se dedica a atacar os meninos famintos de 6 anos em outros continentes.

No outro extremo, está a China milenária. Se dividirmos os seus 1.200 anos por 14 obtemos uma senhora de 85, conservadora, com cheiro a xixi de gato, que passa o dia comendo arroz porque não tem - ainda - dinheiro para comprar uma dentadura postiça. A China tem um neto de 8 anos, Taiwan, que lhe faz a vida impossível. Está divorciada faz tempo de Japão, um velho chato, que se juntou às Filipinas, uma jovem pirada, que sempre está disposta a qualquer aberração em troca de grana.

Depois, estão os países que são maiores de idade e saem com o BMW do pai. Por exemplo, Austrália e Canadá. Típicos países que cresceram ao amparo de papai Inglaterra e mamãe França, tiveram uma educação restrita e antiquada e agora se fingem de loucos.

A Austrália é uma babaca de pouco mais de 18 anos, que faz topless e sexo com a África do Sul. O Canadá é um mocinho gay emancipado, que a qualquer momento pode adotar o bebê da Groenlândia para formar uma dessas famílias alternativas que estão de moda.

A França é uma separada de 36 anos, mais puta que uma galinha, mas muito respeitada no âmbito profissional. Tem um filho de apenas 6 anos: Mônaco, que vai acabar virando puto ou bailarino ... ou ambas coisas. É a amante esporádica da Alemanha, um caminhoneiro rico que está casado com a Áustria, que sabe que é chifruda, mas que não se importa.

A Itália é viúva faz muito tempo. Vive cuidando de São Marino e do Vaticano, dois filhos católicos gêmeos idênticos. Esteve casada em segundas núpcias com Alemanha (por pouco tempo e tiveram a Suíça), mas agora não quer saber mais de homens. A Itália gostaria de ser uma mulher como a Bélgica: advogada, executiva independente, que usa calças e fala de política de igual para igual com os homens A Bélgica também fantasia de vez em quando que sabe preparar espaguete.

A Espanha é a mulher mais linda de Europa (possivelmente a França se iguale a ela, mas perde espontaneidade por usar tanto perfume).. É muito tetuda e quase sempre está bêbada. Geralmente se deixa foder pela Inglaterra e depois a denuncia. A Espanha tem filhos por todas as partes (quase todos de 13 anos), que moram longe. Gosta muito deles, mas a perturbam quando têm fome, passam uma temporada na sua casa e assaltam sua geladeira.

Outro que tem filhos espalhados no mundo é a Inglaterra. Sai de barco de noite, transa com alguns babacas e nove meses depois, aparece uma nova ilha em alguma parte do mundo. Mas não fica de mal com ela. Em geral, as ilhas vivem com a mãe, mas a Inglaterra as alimenta.

A Escócia e a Irlanda, os irmãos de Inglaterra que moram no andar de cima, passam a vida inteira bêbados e nem sequer sabem jogar futebol. São a vergonha da família. A Suécia e a Noruega são duas lésbicas de quase 40 anos, que estão bem de corpo, apesar da idade, mas não ligam para ninguém. Transam e trabalham, pois são formadas em alguma coisa. Às vezes, fazem trio com a Holanda (quando necessitam maconha, haxixe e heroína); outras vezes cutucam a Finlândia, que é um cara meio andrógino de 30 anos, que vive só em um apartamento sem mobília e passa o tempo falando pelo celular com Coréia.

A Coréia (a do sul) vive de olho na sua irmã esquizóide. São gêmeas, mas a do Norte tomou líquido amniótico quando saiu do útero e ficou estúpida. Passou a infância usando pistolas e agora, que vive só, é capaz de qualquer coisa. Estados Unidos, o retardadinho de 17 anos, a vigia muito, não por medo, mas porque quer pegar as suas pistolas.

Irã e Iraque eram dois primos de 16 que roubavam motos e vendiam as peças, até que um dia roubaram uma peça da motoca dos Estados Unidos e acabou o negocio para eles. Agora estão comendo lixo. O mundo estava bem assim até que, um dia, a Rússia se juntou (sem casar) com a Perestroika e tiveram uma dúzia e meia de filhos. Todos esquisitos, alguns mongolóides, outros esquizofrênicos.

Faz uma semana, e por causa de um conflito com tiros e mortos, os habitantes sérios do mundo, descobrimos que tem um país que se chama Kabardino-Balkaria. É um país com bandeira, presidente, hino, flora, fauna... e até gente! Eu fico com medo quando aparecem países de pouca idade, assim de repente. Que saibamos deles por ter ouvido falar e ainda temos que fingir que sabíamos, para não passar por ignorantes.

Mas aí, eu pergunto: por que continuam nascendo países, se os que já existem ainda não funcionam?

NOTA SOBRE O AUTOR:
Hernán Casciari nasceu em Mercedes (Buenos Aires), a 16 de março de 1971. Escritor e jornalista argentino. É conhecido por seu trabalho ficcional na Internet, onde tem trabalhado na união entre literatura e blog, destacado na blognovela. Sua obra mais conhecida na rede, Weblog de una mujer gorda', foi editada em papel, com o título: 'Más respeto, que soy tu madre'.