Hoje o blog Ideia e Ideais completa quatro anos.
Muito mudado?
Na forma talvez, no conteúdo - aprimorado. Antes eu escrevia mais, o blog era mais autoral.
Agora recorto e colo mais (citando as fontes, claro)...
Faço um blog com textos emprestados, tal como fazia meu diário de adolescência copiando frases de Buda e Chaplin.
E.. questiono-me se não seria a interpretação da vida algo também autoral?
Ao escolher um trecho aqui, uma foto ali, um pedaço de ideia acolá, não estarei também sendo autora das minhas postagens?
Acho que sim.
O blog, agora, é isso: uma junção de ideias e ideais que vou colecionando. Para minha coleção, eu busco uma ideia que não tenho, busco um ideal que se assemelha.
Assim, vou me completando nas lacunas e me alimentando na ética da vida.
Vou me reforçando e me construindo, diariamente, costurando o que penso com aquilo que também pensam por aí.
Vou transpondo fronteiras e reafirmando a condição humana, na certeza de que cada vez mais existem muitas ideias e ideais neste mundo absurdamente criativo e diferente.
Parabéns, sobretudo, à minha persistência, que mesmo sob forte pressão tem seguido confiante.
Buscar conhecer, ler, escrever, compartilhar são os meus favoritos prazeres de viver. E assim vou favoritando gente por ai e trechos virtuais (ou mesmo reais).
beijos a quem passa por aqui!
Solange
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Um poema para brindar estes quatro anos!
quem acorda de madrugada e estremece no desgosto de si mesmo ao lembrar que há muitos anos feriu a quem amava;
quem chora no cinema ao ver o reencontro de pai e filho;
quem segura sem temor uma lagartixa e lhe faz com os dedos uma carícia; quem se detém no caminho para ver melhor a flor silvestre; quem se ri das próprias rugas;
quem decide aplicar-se ao estudo de uma língua morta depois de um fracasso sentimental;
quem procura na cidade os traços da cidade que passou;
quem se deixa tocar pelo símbolo da porta fechada;
quem costura roupa para os lázaros;
quem envia bonecas às filhas dos lázaros;
quem diz a uma visita pouco familiar: Meu pai só gostava desta cadeira;
quem manda livros aos presidiários;
quem se comove ao ver passar de cabeça branca aquele ou aquela, mestre ou mestra, que foi a fera do colégio;
quem escolhe na venda verdura fresca para o canário;
quem se lembra todos os dias do amigo morto;
quem jamais negligencia os ritos da amizade;
quem guarda, se lhe deram de presente, o isqueiro que não mais funciona;
quem, não tendo o hábito de beber, liga o telefone internacional no segundo uísque a fim de conversar
com amigo ou amiga;
com amigo ou amiga;
quem coleciona pedras, garrafas e galhos ressequidos;
quem passa mais de dez minutos a fazer mágicas para as crianças;
quem sabe construir uma boa fogueira;
quem entra em delicado transe diante dos velhos troncos, dos musgos e dos liquens;
quem procura decifrar no desenho da madeira o hieróglifo da existência;
quem não se acanha de achar o pôr-do-sol uma perfeição;
quem se desata em sorriso à visão de uma cascata ;
quem leva a sério os transatlânticos que passam;
quem visita sozinho os lugares onde já foi feliz ou infeliz;
quem de repente liberta os pássaros do viveiro;
quem sente pena da pessoa amada e não sabe explicar o motivo;
quem sente pena da pessoa amada e não sabe explicar o motivo;
quem julga adivinhar o pensamento do cavalo;
todos eles são presidiários da ternura e andarão por toda a parte acorrentados, atados aos pequenos amores da armadilha terrestre."
(Paulo Mendes Campos, O anjo bêbado, Sabiá, Rio de Janeiro, 1969, p. 105)
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