25 janeiro, 2009

Aniversário de São Paulo - Só notícias boas!!!

Hoje, além do niver de Sampa, é dia do carteiro e em homenagem a ele vou postar um texto do Affonso Romano Sant´anna que representa da mídia que eu gostaria de ver...

beijos paulistanos a todos!

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Só notícias boas
Por Affonso Romano de Sant'anna
23/06/2005

Acabo de saber que, em Londres, vários jornais decidiram dar ênfase às boas notícias e eliminar uma porção de informações negativas e inúteis. São publicações da Independent London Local Newspapers, que cobrem vários bairros e comunidades. O princípio ético-jornalístico atrás disto é que as más notícias podem ser acolhidas, desde que dêem origem a mudanças positivas.


Sempre me incomodou, por exemplo, estar dirigindo um carro montanha acima num fim de semana, procurando a paz dos píncaros, olhando a paisagem, árvores, pássaros e, de repente, ligar o rádio e ouvir a notícia de que um ônibus capotou na Birmânia deixando tantos mortos e tantos feridos. Indago-me: por que eu, aqui, procurando minha paz, tenho que saber disto? O que isto muda na história da humanidade? Vou poder ir lá tirar alguém das ferragens?

Se a notícia tivesse algum ingrediente excepcional, narrando, por exemplo, que cinco passageiros escaparam de morrer porque tiveram tempo de abrir suas asas e sair voando pela janela do veículo, aí, sim, seria, a meu ver, notícia.


Outro dia andei pensando se o mundo e o país pioraram mesmo ou se houve alguma modificação na imprensa. Possivelmente as duas coisas ocorreram. Mas a sensação que se tem é que os jornais todos viraram uma grande página policial. E essas revistas semanais, então, praticam uma espécie de festival de tiro ao pombo, cada uma tem que vir com um escândalo maior.

Diz John Mappin, que dirige aqueles jornais de boas notícias em Londres: "Os leitores estão cansados de ver notícias sobre alguém sendo atropelado ou assaltado. Nossas pesquisas mostraram que pessoas e negócios não são ajudados em nada pela propagação de más notícias".

Essa declaração tem um corolário interessante, pois o pressuposto que existe é de que o sensacionalismo vende jornais. No entanto, Mappin é categórico ao afirmar: "Fica muito mais fácil vender um produto que provoque reações positivas no público-alvo. Leitores têm escrito elogiando as mudanças".

Isto me faz lembrar quando em Belo Horizonte, no princípio dos anos 60, eu dirigia o segundo caderno do Diário de Minas tendo, vejam só que feras, o André Carvalho como assistente, o Amílcar de Castro e o Eduardo de Paula como diagramadores. Havia levado para lá uma equipe invulgar de colaboradores: Henfil, Olívio Tavares de Araújo, Marco Antônio Menezes, Ivan Ângelo, Ezequiel Neves e outros que debandaram para a Veja e Jornal da Tarde em São Paulo.

Na véspera de um primeiro de abril decidimos fazer um número do segundo caderno, que repetia o desenho da primeira página do jornal, mas só com boas notícias, de
notícias que gostaríamos de ter dado o ano inteiro, coisas assim: Descoberta a cura do câncer, O Brasil torna a emprestar dinheiro aos Estados Unidos, Valério ganha campeonato mundial de clubes.


Se, por um lado, muita gente achou genial a idéia o resultado deixou algumas pessoas decepcionadas, porque num primeiro instante acreditaram nas notícias, sem perceber que aquilo era um bem intencionado "primeiro de abril".



Como cronista bem que gostaria de só falar de coisas belas e essencialmente leves. Teve um tempo em que os cronistas eram assim. Mas a partir dos anos 80 (e eu acho que estou metido nisto) começaram a refletir as guerras, assaltos e o pânico geral. Não há, às vezes, como fugir a isto. Bem que a gente se esforça. Temos que reeducar os olhos, que matinalmente buscam ansiosamente as más notícias e futricas nos jornais. Às vezes, a alma do leitor e do próprio cronista tem necessidades de contemplar o vôo de uma gaivota sobre o mar e descobrir que essa é a imponderável notícia. O vôo apenas. Não está acontecendo nada. A gaivota segue planando, dialogando com o azul. Claro que sob as águas, atrás desse luminoso espelho, desenvolve-se uma luta feroz e fratricida entre as diversas espécies de peixes.

Mas faz bem aos olhos e à alma contemplar por um instante apenas a gaivota e o risco de beleza que se inscreve no ar. Isto também é notícia.


Fonte: Tribuna do Vale, jornal de circulação mensal no município de Itapecerica,
interior de Minas Gerais

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